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Por Bira Dantas 02/03/2011 Estive com minha mulher Claudia Carezzato na França em janeiro. Fomos conferir o Festival de Quadrinhos mais famoso do mundo. Em Angoulême, encontramos os amigos brasileiros Edu Mendes, Barbier, Claudio Martini e Caio Christiano. Mas naquele mundaréu de gente, infelizmente, não encontramos os também brasileiros Diogo Bercito (jornalista da Folha), Koostela e Wander Antunes (quadrinhistas). O Edu Mendes publicou um monte de fotos que tiramos, confira aqui. Quinta-feira, tarde fria do dia 27 de janeiro O trem da SNCF, empresa ferroviária francesa, cruzou exatos 393.48 kms, entre Paris e Angoulême, em quase exatas 3 horas. Eu e Claudia chegamos à lendária cidade, capital dos Quadrinhos no mundo. Minha mulher -e parceira em várias HQs e charges- insistia há alguns anos para que fizéssemos esta viagem. E que viagem! A cidade fica na região de Poitou-Charentes, fica a sudoeste de Paris, e tem cerca de 50 mil habitantes. Durante o evento este número triplica. Ainda no trem, Olivier, um francês que havia morado em São Paulo, gentilmente se ofereceu a nos levar de carro até o distante hotel Ibis Nord. Ainda bem, já que não havia táxi disponível. Seis meses atrás já não havia vaga em nenhum hotel próximo ao Centre Ville, onde o festival acontece. Em alguns restaurantes, a espera por uma mesa era de, no mínimo, 15 minutos. Vínhamos de Londres e Paris, chegamos com quatro malas repletas de Quadrinhos, Comics, BDs, botas, casacos e luvas, e muito frio. Depois do almoço fizemos uma caminhada de 1hora e meia até o Festival. Tentamos fazer o credenciamento como autores, para ter acesso a estandes especiais e passe livre em quase todos os espaços. Mas, que nada. Já estava tudo fechando. Mesmo assim deu pra ter uma ideia do centro da cidade, com prédios antigos, algumas paredes pintadas com BDs (os franceses chamam suas HQs de Bande-dessinées),personagens como Lucky Luke e páginas de Druillet e Moebius aparecem entre janelas e portas. Mas o ponto alto é o Castelo onde funciona a Prefeitura. Além do credenciamento estava lá a exposição fantástica de Lefeust. Por coincidências do destino, ao entrar com Claudia na estação de Trem, escuto: Brazucas pelas ruas quadrinhísticas de Angoulême (clique nos links para ler os textos) 01. Eduardo Barbier, ex-amigo virtual e atualmente amigo real (rs), membro do Quarto Mundo e editor da revista La Bouche du Monde. 02. Bira Dantas, chargista e quadrinhista, criador de Tatu-man, professor de cartum e caricatura na Escola Pandora, membro do Quarto Mundo, gaitista nas horas vagas e de "stress". 03. Claudia Carezzato, minha parceira de cama, mesa, banho e HQ (roteirista de HQs e cartuns) 04. Claudio Martini, amigo de longa data, designer (produziu vários marcadores com caricaturas minhas para a Livraria Pontes de Campinas) editor da Zarabatana, colunista de HQ no site Terra (a editora mostra que vem crescendo, não apenas em prêmios -como o recente Angelo Agostini de Melhor lançamento com Bando de Dois- mas, notem a lojinha com um "Z" em foto que tirei no Centreville. Hmmmm, essa Zarabatana vai longe). 05. Edu Mendes, outro amigo de longa data, quadrinhista e companheiro de Quarto Mundo Sexta-feira, 28 de janeiro, manhã fria Como perdemos o único ônibus que passava no longínquo hotel às 8h40, acabamos indo de táxi com a jornalista de um programa TV de Frankfourt, que faria a cobertura do evento. Fizemos o credenciamento e após fugir do frio, ao sabor de um bom conhaque, econtramos Edu Mendes e Eduardo Barbier (editor da revista La Bouche du Monde e integrante do Quarto Mundo). O grupo foi crescendo, fomos até o estande dos Selecionados do Festival, onde encontramos Claudio Martini (da editora campineira Zarabatana). Almoçamos juntos. Claudia foi pra Gallerie Lafayete, espantada com a quantidade de promoções e saldos de liquidações de inverno. Sua bagagem ganhou mais uns bons quilos. Tentei contato com editores, no intuito de publicar alguma das revistas da série LBQ (Literatura Brasileira em Quadrinhos) da Editora Escala Educacional: Memórias de um Sargento de Milicias (com Índigo, Maurilio DNA e Caio Freitas), Dom Quixote e O Ateneu(com Ronaldo Antonelli). Pensar em vê-las em francês é um sonho e tanto. Encontramos o Caio Cesar Christiano (que vive em Poitiers) e sua mulher. Eduardo Barbier me apresentou aos portugueses do Salão de Humor de Amadora e à Dalila,do Salão de Humor da Argélia, prometi participar de ambos, fui convidado a fazer uma exposição especial lá este ano. Caio e Edu me apresentaram a alguns editores portugueses e franceses, troca de cartões e revistas. Conheci (e caricaturei) o fabuloso desenhista carioca Roosevelt, que mora na Suiça e publica seus quadrinhos surrealistas com o pato Juan Alberto como personagem principal. Reencontrei Claudia, depois de um atraso de 2 horas, pois fiquei rodando por ruas, sem encontrar a tal Galeria. Me mandavam ir “tout à droit” ou virar “a gouche” e eu nunca chegava lá. A gente queria assistir ao show da banda de Rock’n roll com desenhos ao vivo de Baru, o artista premiado do Festival do ano passado e presidente deste. Corremos pro Teatro pra comprar ingressos,mas já estavam esgostados. Ao descer, demos de cara com um coquetel regado à boa champagne, canapés maravilhosos, caviar e camarões sarados. Era a saída da exibição do filme em homenagem ao grande cartunista Wolinsky. Claudio Martini estava no meio e serviu de intérprete. “Monsieur Wolinsky, você é muito mais bonito ao vivo do que na caricatura que fiz do senhor!” Ele foi muito simpático, aceitou de presente as revistas com meus trabalhos e quando uma das organizadoras das filmagens do evento pediu para eu me afastar, ele disse que eu estava junto e fazia questão que o acompanhasse em sua visita à sua exposição. E que exposição! Seu traço simples, direto, bem-humorado, extremamente erótico, cativa qualquer observador desavisado, logo de cara. Eu, Claudia e Claudio corremos para a palestra que iria acontecer com Moebius. Descemos vários andares de uma construção toda estranha, parecia vários galpões, com espaços abertos e escadarias que nos aprofundavam num corre-corre de tropeços e de um não saber aonde vai dar.. Estava escurecendo e de um dos lances de escadas, vi por um janelão de vidro, uma sala com umas 100 pessoas se acotovelando. Era lá. Quando terminamos de descer, os seguranças já estavam barrando nossa entrada naquele lugar estranho. Deu tempo de chegar, mas já estava lotado. Edu Mendes chegou lá uma hora antes, sem a mínima chance de entrar. Nada de Moebius pra gente (ainda bem que vimos a sua exposição maravilhinda -como diria minha filha Thaís- em Paris, na Fundação Cartier). Aí deu pra ter uma ideia daquele prédio. E do morro que a gente desceu. Aquela era uma das muralhas que cercava o centro da cidade de Angoulême, 500 anos atrás. Era a defesa contra os invasores. Êpa, ali os invasores éramos nós (rs)! Pra não perder a caminhada, fomos até o Cité de la Bande Dessinée et de l’Image (CIBDI, Centro de HQ e Imagem), do outro lado do rio. Estava fechando, mas deu pra ver a Turma do Charlie Brown em 36 paineis gigantes com o autor, Charles M. Schultz, os personagens, os cenários e a abrangência dos Peanuts ao redor do mundo. Fascinante. Na volta, descobrimos que não havia ônibus para a região de Champniers, onde fica o Ibis Nord. Era bem Nord mesmo! Não passava nem ônibus lá! Dividimos um táxi com Francois, um advogado francês, fã de Blake e Mortimer, que colecionava os álbuns e originais. O taxista falava de todos os autores de BDs que ele conhecia, de 1960, 1970, 1980. Parece que na França todo mundo adora (a vida toda) e conhece BD como a palma de sua mão. Além da língua francesa, claro. Quase ninguém falava inglês. Ao chegarmos no hotel, o simpático e falante Francois fez questão de pagar o táxi. Ganhou meu Bira Zine, o Memórias de um Sargento de Milícias e uma arte minha de seus personagens favoritos suando em pleno Rio de Janeiro. Sem tiroteios... Sábado, 29 de janeiro, manhã mais fria ainda Meu estoque de tiras do Tatu-man já tinha acabado, depois do café da manhã, voltei pro quarto para produzir mais duas tiras e não deu pra encontrar os amigos. Lá pelas 14h00, fomos pro centro e seguimos por exposições com centenas de imagens, paredes forradas de cartazes de lançamentos, dezenas de estandes com milhares de Quadrinhos e centenas de autores autografando e desenhando sem parar. É uma verdadeira festa. Festa difícil de acompanhar. Tinha pelo menos 5 eventos acontecendo ao mesmo tempo, de hora em hora. Perdemos muita coisa. Achamos outras tantas... Uma exposição do que há de novo nas BDs francesas no Espaço Franquin. Pura arte. E ousada. Exposição de Quadrinhos católicos dentro de uma... catedral! Claro! Óbvio! Mas Crumb dentro da Igreja? Sim, lá estavam páginas ampliadas de sua Gênesis, publicada aqui pela Conrad. Totalmente inusitado, apesar de pertinente. E mais caminhadas pelos estandes. Ganhei um sketchbook do fabuloso italiano Corrado Mastantuono, que já passou por Disney, Bonelli, western, terror e tudo o mais. Claudia ganhou uma caricatura estilo personagem de BD. Virou uma personagem mesmo! Uma figurinha! E o francês todo preocupado se ela tinha gostado, afinal, desenhar autores de HQ é sempre um desafio... Neste ano, até o Mangá teve destaque com exposição especial e concorrendo ao prêmio principal, Pluto, de Naoki Urasawa e La Chenille, de Suehiro Maruo. Sobre isso, meu luzo-amigo Pedro Bouça, um dos maiores conhecedores de BD, escreveu aqui. Concorreram também alguns álbuns publicados no Brasil como Notas sobre Gaza (Joe Sacco) e Logicomix (Apostolos Doxiadis, Christos Harilaos Papadimitriou e Alecos Papadatos). Asterios Polyp (de David Mazzuchelli) será lançado aqui pela Quadrinhos na Cia. Wander Antunes, brasileiro e Jaime Martin, argentino, concorreram com o álbum Toute la Poussière du Chemin. RnR Antédiluvien,com 31 ilustrações, homenageando o bom e velho rock´n´roll, por Baru, Bourhis Hervé (O Pequeno Livro do Rock), Lorenzo Mattotti (Estigmas) e Ted Benoit (Blake e Mortimer). A experiência foi muito rica.O Festival é grandioso, assim como o frio. Muitos eventos acontecem ao mesmo tempo. Exposições, debates, exibições de vídeos, sessões (disputadíssimas) de autógrafos. Hotel longe. Nada de ônibus, exceto pela sorte de conseguir voltar um dia com o ônibus do Festival até o longínquo Ibis Nord. Quase zero contato com os organizadores do evento e editores presentes no evento. Consegui apresentar a um deles o catálogo da exposição organizada pro Gualberto e Dani (da fantástica HQ Mix Livraria, de Sampa) “Isto é França” com 15 páginas de brasileiros, 15 de franceses, uma delas minha, sobre o Festival de Cannes. Muita gente se acotovelando pelos corredores. Muito frio do lado de fora e descascação de cebola na parte de dentro dos espaços destinados às exposições. Mas tudo foi muito bom! O Site Garagem Hermética fez um bom levantamento do evento. Domingo, 30 de janeiro, despedida com manhã gelada Acordamos cedo e fomos de táxi com bagagens quase estourando o peso, a temperatura em 2 graus negativos convidava a chocolate quente e conhaque, mas ainda era cedo para este último. Fomos direto para o aeroporto Charles de Gaulle e compramos mais uma bolsa de chocolates maravilhosso e engordativos. Mais uma noite e voltamos para o calor sufocantemente tropical de Campinas. Saudade de Angoulême (não posso ver uma geladeira aberta que me jogo dentro)... P.S. Repercussões sobre Angoulême 2011 em francês aqui. E em inglês aqui. |
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