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Rock e Quadrinhos – Tudo a Ver
Por Roberto Guedes*
05/04/2010

O mundo do Rock tem mais a ver com o dos Quadrinhos do que possa supor nossa vã sabedoria. Ambas formas de manifestação cultural e artística surgiram em momentos críticos da história da humanidade, apelando para o lado rebelde de jovens ávidos por escapar da monotonia e do lugar-comum.

Os “Comics”, assim definidos pelos norte-americanos, ascenderam ao conhecimento popular ainda no começo do século 20, em meio ao caos da economia e à eclosão de duas guerras mundiais. Com poucas possibilidades de entretenimento, milhões de garotos desencantados refugiavam-se naquelas páginas coloridas repletas de aventura e paladinos imbatíveis, sonhando em ter uma vida parecida com a de seus heróis de papel.

Em meados dos anos 1950, foi a vez do Rock’n’Roll dar voz a uma multidão jovem, que vivia espremida em um mundo que não era o seu. Eram tempos do puritanismo exagerado, de Guerra Fria e das ameaças de bomba atômica e discos voadores, o que fez aquela juventude sem perspectiva encontrar nos acordes de Chuck Berry e cia o seu Graal.

Não demorou muito para as duas formas de mídia se cruzassem, e a as referências de uma a outra aparecessem. Enquanto o grupo vocal The Coasters cantarolava “Charlie Brown” (criação de Charles Schulz), a editora Dell Publishing lançava um gibi do cantor prodígio Rick Nelson.

Ainda nesse período pré-histórico do Rock, o topetudo Gene Vicent alcançou a imortalidade com o hit “Be-Bop-A-Lula”, homenageando a personagem Luluzinha (a preferida do Rei Pelé, diga-se de passagem). Anos depois, seria a vez dos garotos de Liverpool – eles mesmos, os Beatles – serem transportados para as HQs em revista própria. Os anos 1960 foram formidáveis em tudo, principalmente para os franjinhas aí, e até em revistinhas da poderosa Marvel Comics eles deram as caras, ao se encontrarem com o simpático Coisa e o rebelde Tocha Humana no gibi Strange Tales. Pura raridade! Hoje um exemplar desse vale uma nota preta no mercado de usados.

Já os Monkees, a “resposta ianque” aos Beatles, também estrelou uma série em quadrinhos que durou 17 edições. Inclusive, saÍram três ou quatro edições aqui no Brasil pela saudosa EBAL, do Rio de Janeiro. Enquanto isso, Robert Crumb desenhava a capa do álbum Cheap Trills, de Janis Joplin, e lá pela virada dos seventies, foi a vez do “papa dos quadrinhos underground” criar o visual da mascote da revista musical CREEM (“a única revista Rock’n’Roll da América”, como já definia o slogan), o jarrão de leite Boy Howdy. Quem lembra?

Pois é, diz a lenda que as expressões “Punk Rock” e “Heavy Metal” surgiram inicialmente nas páginas da CREEM. Mais Cultura Pop que isso, só se colocássemos o Homem-Aranha na capa de um exemplar. Hey! Mas não é que isso realmente aconteceu em 1973, quando o formidável John Romita, desenhista oficial do Aranha, ilustrou a mesma?

Falando no aracnídeo, ele “cantou” em seu próprio vinil, o Rockomic, contando com os super-heróis negros Luke Cage e Pantera Negra no baixo e guitarra respectivamente. O “viajandão” Surfista Prateado faria seus solos à la Emerson, Lake & Palmer nos teclados. O magazine Rolling Stones não ficou pra traz, e tacou o Incrível Hulk na capa de uma de suas edições.

Mas o que marcaria definitivamente a década seria o gibi do Kiss lançado pela Marvel. Numa tarde ensolarada, Gene Simmons e sua trupe seguiram com o roteirista e editor Stan Lee à gráfica de Buffalo, no estado de Nova York, para jogar umas gotas de sangue na tinta de impressão. WOW! Bizarrice pouca é bobagem, mas o fato é que a revista foi a mais vendida da década, esgotando-se das prateleiras num piscar de olhos.

Simmons, fã inveterado de comic books, ao idealizar a banda com suas roupas extravagantes, encarnou um vampirão com asas inspiradas no  super-herói Raio Negro, de Stan Lee e Jack Kirby. Poucos sabem, mas desde a  sua mocidade ele já rascunhava seus fanzines e sonhava com a glória. Não só a dos palcos, mas a dos gibis também. E isso aconteceu da forma mais gloriosa possível, ao chutar, nos quadrinhos, os fundilhos do diabólico vilão Dr. Destino. Go, Gene!

Em 1997, Peter Criss, Ace Frehley e as máscaras voltariam ao KISS, e com o lançamento do CD Psycho Circus – que acabou “batizando” uma série em Quadrinhos regular pela editora Image – retomaram o caminho do sucesso. Algumas dessas novas histórias foram publicadas no Brasil pela Editora Abril, mas não possuem o mesmo charme daquelas feitas pela Marvel nos anos 1970.

Aqui no Brasil a coisa não foi diferente. Impossibilitado de licenciar Roberto Carlos para viver suas aventuras nas páginas impressas (Roberto, que cantava “Brucutu”), o ilustrador Macedo A. Torres criou o Golden Guitar, um super-herói que tinha como arma uma guitarra que disparava dardos tranqüilizantes e outras maluquices. Em sua identidade secreta era o cantor da juventude, Renato Fortuna, uma alusão mais do que evidente ao Rei da Jovem Guarda.

Em anos mais recentes, um sucesso de público e crítica se encontrou nas tiras do carismático Roko-Loko do premiado cartunista Marcio Baraldi. O cartunista também transformou em quadrinhos a banda Exxótica, uma espécie de KISS brasileiro. Outras empreitadas com bandas nacionais são o gibi N’Roll ,da editora Roadie Crew, cujo primeiro número quadrinizou uma música do super cantor André Matos, um dos maiores do Heavy-Metal brasileiro, e o NFL Comics, de Hamilton Tadeu, que transformou em guerreiros bárbaros os membros das bandas Krisiun, Torture Squad e VoiVod. Já este que vos escreve, tem em seu personagem Meteoro, um guitarrista canhoto muito chegado em Status Quo e Rolling Stones. E falando na banda de Mick Jagger, a mesma não poderia ficar de fora, estrelando sua própria revista de luxo “Voodoo Lounge”, na ocasião do lançamento do CD homônimo em 1995. A paquera dos Stones com os Quadrinhos é antiga, vide a HQ que faz parte do encarte do Between the Buttons (1967), feita por ninguém menos que o baterista Charlie Watts.
Além dos quadrinhos é bom lembrar das inúmeras capas de discos ilustrados por quadrinhistas famosos,como Kelly Freas, autor da capa de News of the World, do Queen, Boris Vallejo, que ilustrou disco do Molly Hatchet, o badalado Todd McFarlane (Spawn), que fez muitas capas para banda Iced Earth, além do maravilhoso Ken Kelly, famoso capista de Conan, que fez todas as capas da banda Manowar, várias para o Rainbow, além das duas capas clássicas de Destroyer e Love Gun, do KISS.

Enfim, as referências são inúmeras e daria pra escrever um livro inteiro sobre elas, até com riquezas de detalhes. De como o Pink Floyd meteu o Dr. Estranho na capa de um de seus primeiros discos, ou de como o Surfista Prateado foi parar num LP do Joe Satriani, e ainda, a trilha sonora do Flash Gordon – um dos maiores ícones sci-fi da Arte Seqüencial – feita pelo Queen. Sem falar nos gibis de Alice Cooper, Brenda Lee, Guns N Roses e Raul Seixas, e até da minissérie Umbrella Academy escrita pelo vocalista do My Chemical Romance, Gerard Way, e ilustrada pelo brasileiro Gabriel Bá, só para não me estender de mais.

Por isso, meu chapa, se você tem um desses, guarde com muito carinho. Ora, mais do que o valor monetário que porventura um exemplar desses poderá te propiciar, a quadrinização de uma banda ou astro de Rock é algo totalmente cool, cult e, com certeza, um pedaço de Cultura Pop inestimável que você tem em suas mãos.

*Guedes é escritor e roteirista, autor de diversos livros sobre Quadrinhos, como o premiado “A Era de Bronze dos Super-Heróis”; e garante que já teve uma banda de Rock.

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