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Resenha: Almanaque Gótico #2
Por Matheus Moura
26/10/2009

Mais de um ano depois O pequeno Almanaque Gótico cresceu. Com mais páginas, mais caro e duas capas, agora é apenas Almanaque Gótico. Outra mudança: a Editora Mayor saiu de cena dando lugar a Terror S/A. De acordo com os editores, eles pensaram “alto demais com essa história de editora”, sendo o novo selo mais próximo da real proposta do grupo. Parece ter funcionado. Dá para ver a mudança pela capa. Se, enquanto pequeno, o Almanaque possui uma capa ao estilo Vertigo, da DC Comics, agora (ao menos uma das capas) tem alusão clara às revistas de terror nacional com cores chapadas, letras tremidas, chamadas chocantes e zumbis! A segunda capa é moderna e não há chamadas. Há apenas o título e o preço. Chega a ser romântica, com sangue, floresta e uma garota gótica. Lembrando do texto, O Gótico, publicado na primeira edição do Almanaque, essa dualidade é intrínseca ao próprio gótico. Uma boa sacada dos editores. Outro ponto positivo dos editores foi dedicar duas páginas para apresentação dos autores e colaboradores da revista. No entanto a iniciativa ficou devendo por não destacar em quais histórias e edições cada autor contribuiu. Isso acaba por criar confusão, pois, apesar do maior número de páginas, a Almanaque #2 tem menos autores. 

Outra novidade deste segundo número é um conto de “horror” – sim, com aspas mesmo, uma vez que não há nada de horrível no conto. A autora, Anne Caroline Quiangala, peca por criar uma narrativa descritiva demais. O terror causa medo justamente por ser algo indizível, além do que se pode compreender. “Mostrar” o horror é anular a aura que causa medo. E é justamente isso que Anne faz. Mas, a ilustração da página salva o espaço – apesar de contribuir para a retirada da aura do conto. Assim como nas capas, os editores também se esqueceram de dar o crédito à Ilustração. Com relação às HQs, Fragmentos do Apocalipse, com argumento de Cazelli e desenhos de Turbay, é a clássica HQ de terror nacional. Toda feita em narração, com desenhos que remetem a algo não tão moderno. A trama me lembrou o filme A Profecia. Em seguida há um texto assinado por José Salles, da editora Júpiter 2. O título do referido é Criaturas da Noite. No caso, Salles narra em tom de diário como conseguiu o exemplar da HQ que batiza o texto e no final faz uma breve avaliação da revista. Ao meu ver o artigo poderia ter se prendido mais à HQ e menos na vida do escritor. Como mencionado, ficou parecendo muito um diário e menos uma análise. Se essa foi a intensão, deu certo. Se não, há de se rever o método.

Matando a Fome é assinada por Cazelli (texto), Tubay (lay-out) e Rafael Abel (desenhos). Uma HQ muito bonita, toda desenhada em tons de cinza, destoando bastante da anterior, tanto em estilo quanto técnica. A narrativa é interessante e faz o leitor acreditar em uma coisa sendo outra no final. Na sequência há Segunda-Feira, assinada por Cazelli e Turbay. Mais uma vez Turbay usa em abundância retículas para dar preenchimento às imagens. Esse tipo de recurso cai muito bem em HQs de terror que primam pelo tradicionalismo. Essa história em especial, para mim, está entre as melhores da revista, não tanto pelo desenho, mas pelo ritmo imposto pela trama. Falar demais estragaria a surpresa. Mas dá para adiantar que a capa é baseada nela. O Diabo é o Pai do Rock, com texto de Cazelli, arte de Abel, tem no título uma clara alusão a música do Raul Seixas, Rock do Diabo. A história em si não é tão interessante e não chama muita atenção. Ao contrário dos desenhos que estão muito bem executados e conseguem dar o clima obscuro necessário à história.

Cotidiano é assinada por Anne Quiangala, com traços de Jean Diaz. Nessa HQ Anne comete o mesmo erro do conto que assina na revista. Já começamos sabendo o que está acontecendo. Outro ponto que não ajudou foi a disposição das páginas. Para uma HQ curta, de apenas duas páginas, em que o clímax está no final, seria interessante o leitor não ter acesso imediato ao fim. No entanto, em Cotidiano, ambas as páginas da história estão no mesmo plano de visão, o que contribuiu para tirar a surpresa. Nesse ponto da revista é chegado o momento de invertê-la e ter acesso à outra Almanaque, menos gore e violenta. E a primeira HQ desse lado é Atitudes Infantis, com texto de Cazelli e arte de Abel. A história em si mostra o relacionamento conturbado entre um casal de irmãos e a velha questão do irmão pegar no pé da irmã. Porém, na sequência de atitudes infantis o pior acontece. Uma história simples, que, devido à bela arte, consegue prender o leitor. Destaque para a representação feminina.

Coleções é outro destaque da publicação. Com texto de Cazelli e ilustrações de E. Thomas, a HQ mostra um casal de amantes que resolve fazer magia por conta própria. Nessa história, em especial, há várias referências, desde grande pintores a autores de contos de horror. Os desenhos de Thomas são um tanto sujos mas dão um clima interessante. Logo após há uma história de uma página chamada Ontem, Nada Especial, desenhada por Carlos Brandino e com texto de Leonardo Santana. Assim como na Almanaque #1, Leo Santana participa com a série O.N.E., que tem justamente como proposta contos de uma página. Apesar de ser uma proposta bacana é devida a essa limitação que Ontem, Nada Especial, não consegue se destacar. Ao contrário da HQ publicada anteriormente em que o texto era sucinto e havia um ponto alto no final, na de agora não é assim. A história é fraca e recheada de textos, o que torna a desenrolar da trama truncado e o final enfadonho. Por outro lado os desenhos estão excelentes.

A última HQ da revista se chama Sábado à Noite. No caso, ela estaria mais para o gênero Terrir. É uma história totalmente descompromissada com o terror, a começar pelos traços, levados para o lado infantil. Os desenhos estão a cargo de Turbay e o texto é de Claudia Gomes. Antes de fechar a revista há o artigo Gótico - parte 2, desta vez escrito por Anne Caroline Quiangala, com apresentação do editor Cazelli. O título do artigo é O Gótico na Literatura do Século XIX, no entanto a autora só passa a falar no gótico no século XIX da segunda metade para o final. Ela se deteve muito em falar do gótico antes – o que já havia sido feito na primeira edição do Almanaque. Outro ponto que não ajuda muito é o academissísmo exagerado. Para um artigo com maior profundidade e espaço seria interessante desenvolver o texto por esse lado, mas não é o caso. Acaba que o texto ficou pesado e sem um fio condutor homogêneo.

Mesmo com falhas (assim como toda revista), Almanaque Gótico #2 merece e muito ser lida. A maior mágica que o time criativo realiza é, mesmo com um pequena equipe, mostrar diversidade e não se prender apenas a fórmulas pré-produzidas. Muita das vezes não parece que a mesma dupla (Cazelli e Turbay, por exemplo) realizaram mais de uma história diferente, tamanha a singularidade de cada. Para adquirir seu exemplar basta entrar em contato pelo email alamanaquegotico@gmail.com. Vale a pena!

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