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Como foi: quinto dia do 6º FIQ (MG)
Por Matheus Moura
13/10/2009

Rafael Grampá e Jozz no FIQ

O dia mais esperado para o FIQ, tanto para os artistas, organização e expositores, era unânime: sábado (10). E não foi por menos. De todos os dias até o momento, sábado foi o que mais encheu. Houve ocasiões de ficar impossível transitar dentro da área de estandes. E não só nela, nas exposições e todas as mesas de bate-papo houve recordes de presença. Às 14h30 começou a segunda seção de conversa - a primeira ocorreu uma hora antes com o artista alemão Jens Harder. Na verdade foi uma espécie de continuação da do dia anterior com relação ao Batman, só que desta vez para debaterem a respeito da mega nova saga da DC Comics, chamada, Blackest Night. Ao contrário da programação inicial que previa apenas Eddie Berganza e Ivan Reis na mesa, além deles estiveram presentes Ivan Freitas da Costa, Eddy Barrows e Joe Prado. Esse último comentou ser ele o designe dos personagens da série e ter criado todo o visual obscuro deles. Foi ainda revelado, com exclusividade, a existência de 85 Black Lanterns, ou Lanternas Negras, e já ter ao menos mais 12 sendo preparados. Berganza, editor da DC Comics, por sua vez disse que a editora pretende construir algo relevante com essa nova série – esse comentário se deu devido à comparação, feita por alguém da platéia, quanto à saga Marvel Zombies. Em determinado momento da conversa foi levantada a provocação de Alan Moore que, não faz muito tempo, comentou que a Blackest Night era uma cópia de uma HQ antiga dele. Berganza argumentou que, apesar de Moore ser um gênio, ele estava falando besteira, pois Blacknest Night não tinha nada a ver. O editor da DC ainda conseguiu ser ovacionado por dizer que Moore nem ao menos deveria ter lido alguma história da série por dizer algo do tipo. Perguntaram ainda quanto à compra da Marvel pela Disney. De acordo com o editor, para ele não fez muita diferença e salientou que a criação da DC Entertainment não é uma reação a essa aquisição da Disney.

Ivan Reis respondeu uma pergunta sobre o espaço para roteiristas brasileiros no mercado americano. Para o desenhista, a principal dificuldade é a questão da cultura, uma vez que as editoras estadunidenses criam suas histórias, mesmo sendo universais, especificamente para o público natural de lá. Assim, a visão dos brasileiros não se encaixaria tão bem na criação do que os leitores americanos realmente querem consumir.
Em seguida houve o papo relâmpago com Rafael Grampá. O desenhista comentou ter desenvolvido sua técnica de hachuras durante o tempo em que trabalhou como design de calças para Diesel. Ele disse ainda que, com relação ao mercado, não se pode contar com ele e quem pretende entrar para o mundo dos Quadrinhos deve produzir “para o mundo”. Confessou que a adaptação para cinema do Dobro de Cinco, baseado na HQ homônima de Mutarelli, está parada por falta de recursos, e salientou que no momento estão com um projeto de levar as HQs de Mutarelli para outros países. Dando continuidade a programação ocorreu outro bate-papo relâmpago, desta vez com os coloristas Cris Peter e Rod Reis. Cris é a esposa de Rafael Albuquerque e trabalhou com ela no Pop Art Comics Studio, atualmente desativado. Ambos os profissionais das cores comentaram quanto aos processos de criação, importância do trabalho de cores, além de frisarem que no Brasil, não há possibilidade de um colorista de Quadrinhos sobreviver apenas com essa atividade, e nos EUA sim.

O quadrinhista Guy Delisle

Guy Delisle, autor de PyongYang, Crônicas Birmanesas e do recente Shenzen compôs a mesa das 16h30. Sóbrio, sério e centrado no que diz, Delisle discorreu sobre animação e HQs, falou do início de carreira e a partida do Canadá para a França. Foi interessante ele mostrar na tela uma animação básica de uma bola saltitante, uma vez que no livro Crônicas Birmanesas ele cita o mesmo exercício quando descreve o início das aulas informais de animação que dá a alguns nativos. O autor disse ainda que, a exemplo do Brasil, Portugal não publicou de início seu primeiro livro, Shenzen, mas sim algum outro. No caso do Brasil foi PyongYang. Todas as versões nacionais do autor são publicações da Zarabatana Books. Durante a conversa Delisle mostra duas animações curtas. Uma feita apenas como estudo e outra que não despertou interesse de publicação. Além de uma sequência de quadros, uma espécie de Quadrinhos sem páginas, em que uma história específica, chamada Aline, causou mal estar na Palestina. Isso foi devido ao fato de haver cenas em que a personagem principal é mostrada sem camisa e com os seis expostos. Diz Delisle que um terço dos integrantes da palestra, que estava sendo ministrada na Escola de Belas Artes, deixou o local. O autor deixou recentemente a região e logo veio ao Brasil. De acordo cm ele, é possível no futuro fazer um trabalho sobre esse período no Oriente Médio, mas antes as “idéias devem decantar”. Quanto ao processo criativo, Delisle deu como exemplo uma página de PyongYang em que mostra sua chegada ao país. Na ocasião ele explicou o porquê de ter dividido a estátua do ditador em três partes e a ter mostrado de baixo para cima, ao contrário de por inteiro. Para ele, essa foi a maneira de desconstruir a imagem opulente do ditador.
Outro ponto de destaque foi Delisle mencionar que na Noruega mudaram as cores da capa de PyongYang com a explicação de que não queriam que parecesse ser uma história em quadrinhos. Para Delisle há hoje uma inversão de valores quanto ao seu material, pois antes nenhuma editora queria publicar Shenzen e agora elas que o procuram a fim de adquirirem os direitos. Quanto questionado sobre a possibilidade de animar algum de seus livros, Delisle foi enfático em dizer que conhece todo o processo de animação e não tem nenhuma vontade de fazer como Marjane Satrapi, com Persépolis. Na mesa com o autor canadense estava o jornalista Pablo Pires, o qual às vezes levantava uma questão ou outra.

Joe Prado, Sidney Gusman e Amauri de Paula

Às 18h começou a mesa que discutiu o problema dos scans e Internet. Estiveram presentes Amauri de Paula, Joe Prado e Sidney Gusman. Cada um deu seu ponto de vista da questão. Sendo Amauri um dos responsáveis pelo site Acervo HQ, que disponibiliza histórias para serem baixadas gratuitamente, ele começou expondo alguns dados referentes a uma experiência feita com a coleção Cidades Ilustradas, da editora Casa 21. De acordo com Amauri, o livro referente ao Rio de Janeiro teve mais de 30 mil downloads, sendo a primeira tiragem impressa de 3 mil exemplares e a segunda de 2 mil. Ainda de acordo com Amauri, a editora Casa 21 não teve as vendas prejudicadas, uma vez que já estão na terceira tiragem do material. Dados como esses, para ele, demonstram a viabilidade do sistema de downloads e a possibilidade de coexistência entre o formato tradicional impresso e o online. Sidney Gusman ressaltou que a Casa 21 possui incentivos do governo e por isso não depende de vendas diretas para obter lucro. Por outro lado ele lembrou que a realidade hoje “não tem mais volta” e a questão agora e achar uma maneira saudável de utilizar o sistema de distribuição online, para que, artistas e editoras, não tomem prejuízos. Tanto a platéia quanto os participantes levantaram propostas para se aproveitar a capacidade de difusão dos scans. E, apesar de haver várias boas idéias, Sidney disse que se hoje não se toma uma decisão definitiva para resolver o problema, é devida a preguiça e acomodação das editoras. Joe Prado se ateve a abordar os prejuízos dos autores com os scans, nada muito significativo.

Lançamento da Pixu: Gabriel Bá, Vacilis Lolos, Becky Cloonan e Fábio Moon


A mesa subseqüente foi a mais cheia do dia e teve como atração Craig Thompson, autor de Retalhos, recentemente lançado pelo selo Quadrinhos na Cia. Craig falou de sua carreira, processo criativo, forma de trabalho. Ao lado dele, havia Bira Dantas, que começou com uma pergunta referente ao alcance do trabalho de Craig, principalmente Retalhos, uma vez que a própria filha de Bira, de apenas 9 anos, “se apaixonou” pelo livro. Craig respondeu que não pensou na abrangência do material e que apenas o fez com sinceridade pensando em não decepcionar o público. Por outro lado ele é triste com o público americano masculino adolescente, pois eles não dão atenção ao livro, sendo muito pouco lido por eles. De influências, Craig diz ter seguido bastante os passos de Will Eisner e das HQs francesas. Isso se reflete até mesmo na preferência de estilo, sendo por ele o preto e branco o método que lhe dá mais prazer. De acordo com o quadrinista, ele só fez, e faz, trabalhos coloridos para ganhar dinheiro. Craig comenta ainda sobre o novo trabalho em desenvolvimento, chamado Habibi e que se passa no Oriente Médio. Algo como as noites árabes, pelo que diz o tradutor. O livro, atualmente, já possui 500 páginas prontas e, pelo que diz Craig, deve ter em média umas 700 páginas. Para o autor, a idealização desse trabalho passa pelo pressuposto dele já ter se cansado de falar de si mesmo. Assim ele passa para uma HQ fictícia, mas calcada em pontos reais. O termino de Habibi está programado para daqui um ano. Para fechar o bate papo com Craig foi discutido se ele não se incomoda em se expor tanto como fez no livro. O autor disse então que, quando deu início ao projeto, não havia imaginado que alcançaria um público tão grande de leitores e tudo o que fez foi com a consciência limpa. O problema maior foi com os pais dele. A mãe ficou extremamente chateada, assim com o pai. Isso gerou discussões e mal estar entre eles, principalmente pela escolha religiosa de Craig e a exposição de sua infância, o que gerou a indagação do pai de Craig: “Sua infância não foi tão ruim assim, a minha foi pior. O que te faz achar ser tão especial?”. Saiba como foi o primeiro dia (aqui), o segundo dia (aqui), o terceiro dia (aqui) e o quarto dia (aqui) do evento.

(fotos: Nathalia Turcheti e Luiz Navarro [Assessoria do FIQ])

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