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Por Marcio Baraldi 05/06/2009 "Não me incluo entre os frustrados!" Seu texto é curto e grosso e racional ao extremo! E foi com esse estilo “âncora de telejornal” que Paulo Ramos (que aliás, já foi âncora na TV Cultura) se consolidou como o mais ativo e respeitado crítico de Quadrinhos brasileiro atual. Seu Blog dos Quadrinhos é o veículo que mais resenha lançamentos de HQs no país. A quantidade de publicações que Paulo resenha todos os dias é tão impressionante, que mal dá pra acreditar que o sujeito faz tudo aquilo sozinho. Com tanta sobrecarga de trabalho nas costas era de se esperar um jornalista estressado e irritadiço total. Ledo engano! Mesmo com tanto trabalho Paulo ainda consegue ser um sujeito dócil, contido e tranqüilo 24 horas por dia. Acadêmico precoce, ainda adolescente Paulo ingressou no ofício de docente de língua portuguesa, carreira que desenvolveu nos últimos 17 anos e que chega agora a um patamar invejável: de posse do título de Doutor, Paulo vai começar no semestre que vem a dar aulas de Histórias em Quadrinhos na Unifesp. Paralelo à carreira acadêmica, Paulo ralou muito como jornalista, apresentador e editor na grande imprensa. Agora, com tanta experiência acumulada, chegou a hora do sujeito reunir um pouco dela em seu primeiro livro, o recém-lançado A Leitura dos Quadrinhos, pela Editora Contexto. Você que está acostumado a ler os textos de Paulo todo dia, confira agora um pouco sobre o homem por trás do blog mais acessado do mercado de HQs brasileiro. Nem Pasquale, nem Girafales, este sim é o Professor mais popular do pedaço!!! E silêncio na classe que o Mestrão vai falar! Shhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh........ Já existem muitos livros no Brasil analisando os Quadrinhos. No que o seu livro A Leitura dos Quadrinhos se difere dos outros? Na sua opinião, quais são os melhores livros já lançados sobre o assunto, aqueles que ninguém pode deixar de ler (não vale o seu, né? - risos)? Tenho uma leitura um pouco diferente da sua, Baraldi. Entendo que ainda existem no país poucos livros sobre análise dos Quadrinhos, principalmente produzidos por pesquisadores daqui. Em cursos universitários, há uma grande dificuldade na hora de compor a bibliografia. Parte das obras já está esgotada ou é estrangeira. Sobre os livros a respeito do tema, creio que Os Quadrinhos, de Antonio Luiz Cagnin, seja uma referência obrigatória. Pena estar esgotado. Você foi daqueles moleques que aprendeu a ler com os gibis ou você foi se interessar por Quadrinhos depois de adulto, já com uma ótica acadêmica? Lia Quadrinhos desde antes de me alfabetizar. Tentava entender as histórias por meio da leitura das imagens. O interesse aumentou ainda mais quando aprendi a ler. E segue até hoje. Seus textos em seu blog são sempre muito racionais e jornalísticos. Você parece não se deixar levar por paixões ou expor seu gosto pessoal jamais. Isso é reflexo de sua personalidade mesmo ou você desenvolveu esse estilo por ter frequentado o meio acadêmico a vida inteira? Essa postura, na verdade, é uma exigência do jornalismo. Sou de uma escola que vê na imprensa o dever profissional e a incumbência ética de noticiar da forma mais precisa, imparcial e desapaixonada possível. Isso vale para os Quadrinhos, para as críticas de arte, para o noticiário policial, para a cobertura política, para qualquer área. Por falar em meio acadêmico, você dá aulas desde muito jovem, não? Conheço zilhões de pessoas que tiveram aulas com você. Você é uma espécie de Professor Pasquale de sua geração (risos). Você começou a dar aulas por necessidade econômica ou sempre foi seu projeto de vida? Você parece muito confortável no meio acadêmico. Comecei a dar aulas numa rede de cursinhos pré-universitários do ABC paulista. Curiosamente, tinha o Pasquale como colega. Não tinha nem 20 anos. Iniciei como monitor e, em pouco tempo, surgiu a oportunidade de assumir aulas de língua portuguesa. Fui fisgado de imediato pela atividade docente. Tentei sempre conciliá-la com as outras atividades jornalísticas. Você sempre deu aulas de português, mas sua intenção final é dar aulas sobre Quadrinhos? Na sua opinião qual a importância desta matéria nas universidades? Sempre dei aulas de língua portuguesa, mas não só disso. Atuei também no curso de jornalismo da Universidade Metodista, no ABC paulista, por quatro anos e meio. Hoje, estou vinculado ao curso de Letras da Unifesp, Universidade Federal do Estado de São Paulo. Começo, no segundo semestre, a dar aulas específicas de Histórias em Quadrinhos. Creio que incluir o tema Quadrinhos na grade curricular universitária - tanto na graduação quanto na pós - seja essencial para entender melhor a linguagem e fomentar pesquisas a respeito do tema. Você já é Doutor? Resuma brevemente o que você acha dos Doutores Sonia Luyten, Luis Antonio Cagnin, Waldomiro Vergueiro, Flavio Calazans, Gazy Andraus e Edgar Franco (pode citar outros se você quiser). Sou Doutor, formado em Letras pela Universidade de São Paulo. Todos os colegas que você cita também são doutores formados pela USP. Vejo todos com grande respeito teórico, profissional e pessoal. Na sua opinião de crítico,quais são os cinco quadrinhistas mais importantes de todos os tempos?Justifique cada um deles. Vai parecer que estou fugindo da pergunta, mas, de fato, é muito difícil pontuar cinco nomes. Há vários autores que foram marcantes, ou para a consolidação da História em Quadrinhos como linguagem, ou por motivos estéticos. E a lista, seguramente, não cabe nos dedos da mão. Você atualiza seu blog diariamente com resenhas de lançamentos. Quantos livros e gibis você calcula que já resenhou? Você consegue realmente ler tudo que é lançado? Sua mulher não reclama de você gastar tanto tempo com gibis, não (risos)? Nunca contei quantas resenhas ou notícias escrevi. Erraria se arriscasse um número. Acredito que ninguém consegue ler tudo o que é publicado. Tento ler o máximo possível e, desse possível, separo os que julgo relevantes para serem resenhados. Parto do pressuposto de que uma apreciação crítica da obra só pode ser feita após a leitura dela. Minha noiva entende bem o meu interesse pessoal e profissional pela área. Tanto que sempre me acompanha em eventos de Quadrinhos. Você deve ter começado a ler gibis entre os anos 70 e 80. Como você avalia as mudanças radicais entre os Quadrinhos de super-heróis daquelas décadas e os atuais? Na sua opinião de crítico, qual período é melhor? Por quê? Os Quadrinhos de super-heróis, hoje, estão mais adultos e realistas do que os lidos nas décadas de 1970 e 80. A mudança foi essa. Deixaram de ser juvenis para se tornarem obras para adolescentes e, principalmente, jovens adultos. Tivemos ontem boas e más histórias. Temos hoje boas e más histórias. Para o leitor, o segredo continua o mesmo: saber separar o joio do trigo. Se você fosse Ministro da Cultura, o que você faria de eficaz para o desenvolvimento do Quadrinho Nacional? Pergunta difícil. Lanço quatro idéias, a serem aprimoradas. Primeira: um concurso nacional de Quadrinhos aos moldes dos salões de humor. Seria uma forma de aprimorar a qualidade das histórias e revelar bons roteiristas. Segunda: incentivar a produção de Histórias em Quadrinhos por meio de editais públicos. Terceira, que seria feita em parceria com a pasta da educação: incentivar a leitura e a produção de Quadrinhos nas escolas. Quarta idéia: criar espaços para Quadrinhos nas bibliotecas públicas e escolares. Sei que você não é vidente, mas como você acha que será o mercado não só de Quadrinhos mas de publicações impressas em geral, daqui uns 20 anos? Ainda existirão publicações de altas tiragens? Ainda restará algo impresso? Onde estarão as HQs em 2029? Baraldi, o mercado de Quadrinhos brasileiro é uma caixinha de surpresas. Quem imaginaria há uns três, quatro anos que a linha adulta da DC iria para Pixel e que, dois anos depois, o contrato seria cancelado para a editora investir numa versão jovem da Luluzinha feita em mangá por autores nacionais? Por isso, não é possível prever nada. Seria apenas um chute de minha parte. Muita gente acusa os críticos de serem artistas frustrados, que foram escrever justamente por não saberem desenhar ou tocar um instrumento musical. Você já se sentiu um artista frustrado alguma vez? Você nunca quis ser desenhista ou roteirista? Não me incluo entre os "frustrados", se é que eles realmente existem. Pelo contrário. Fui abençoado com a oportunidade de atuar em áreas das quais sempre gostei. Quanto à questão da produção de histórias, coloco-me no meu lugar de leitor, pesquisador e jornalista. É onde queria estar. Reconhecer um artista ruim e fácil. Há quilômetros se vê quando um desenho é malfeito. Mas e os críticos? Como reconhecer quando um crítico é bom ou ruim? Tenho por obrigação profissional ler o máximo possível. Não só a pauta diária da imprensa, mas também o que os colegas especializados noticiaram no dia. Os únicos textos que tento não ler são as críticas de obras em Quadrinhos. Evito para que o conteúdo e o enfoque do colega não influenciem o meu olhar a respeito da publicação. Por isso, não me considero o mais apto para avaliar quem é bom ou não na difícil tarefa de resenhar Quadrinhos. Se você pudesse trocar de lugar com um quadrinhista por um dia, quem você gostaria de ser? Por quê? Sinceramente? Não gostaria de trocar de lugar com um quadrinista. Gosto do que faço - e também do que os quadrinistas fazem. Quais seus planos para o futuro? Continuar atuando como pesquisador, docente e jornalista. E ler ainda mais livros. Deixe aquele famoso recado final para a posteridade. Agradeço a atenção e a lembrança de meu nome, Baraldi. O Bigorna.net agradece a Paulo Ramos pela entrevista, realizada em 29/05/2009 |
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