Puxa, que frase tristemente repetitiva. Este ano foi difícil. Começou com a morte de Eugênio Colonnese (08/08). Depois Gedeone Malagola (15/09). E recentemente, Cláudio Seto (15/11). Por que sofremos tanto quando morre um ícone como estes? Talvez por que a sociedade ocidental olhe para a morte com tanto medo. Medo do desconhecido, da vida pós-morte ou ainda, do nada... Ou culpa. Culpa por não ter reatado uma relação estremecida, culpa por não ter reconhecido o mérito do outro, culpa pela falta de amar o próximo.Por medo, culpa ou outro motivo, é fato que o ocidental se relaciona mal com esses ritos de passagem. Não estamos preparados para perder nossos pais, irmãos, amigos, nossos ídolos. Dizem que os orientais choram quando nasce uma criança e festejam quando alguém morre. Não sei se é assim, só sei que aqui a gente faz o contrário... Quando Elis morreu, a comoção foi tão grande. Ela era um ícone da MPB, da música-cabeça, da luta contra a ditadura.
O assassinato de John Lennon deixou milhares de fãs chocados mundo a fora. Assim foi com Marthin Luther King. E com Jayme Cortez quando morreu em 1987. Foi uma comoção na AQC (Associação dos Quadrinhistas e Caricaturistas SP). Depois de doarmos sangue no hospital, saímos todos pra tomar umas biritas (eu, Gual, Jal, Floreal, P.Batista, Marcatti, Worney, Guida, Spacca, Rocco e mais um monte de gente que não lembro) no bar em honra ao nosso grande amigo. Ou Ely Barbosa, trabalhei no seu estúdio como free-lancer de 1980 a 1982, desenhando Os Trapalhões. Eu lhe dediquei meu segundo troféu Angelo Agostini. Ele morreu em 2007. E ainda, Henfil, que arrancou lágrimas de milhares de pessoas em 1988, ao perder a luta contra a AIDS, doença contraída ao receber transfusão de sangue. Ele era hemofílico (como Betinho e João Mário, seus irmãos também mortos pelo sangue contagiado). O ministério da saúde da ditadura brasileira alegava ser muito caro examinar o sangue que era doado aos hospitais.
Mas voltando aos quadrinhistas que citei no começo do texto, eles foram artistas de alto gabarito. Contribuíram sobremaneira com a história do Quadrinho Brasileiro. Dedicaram-se à arte dos Quadrinhos com afinco hercúleo. Não pouparam madrugadas em claro, produzindo sem parar, cumprindo prazos, aperfeiçoando suas técnicas. Foram Mestres Maravilhosos, com “Ms” maiúsculos. Trataram os novatos com a delicadeza própria de gentlemen que eram. Por isso, saber que eles não trilham mais os mesmos caminhos nesta dimensão planetária, deixa na gente uma tristeza, uma saudade, como a que sinto do meu pai, o “Seu Clóvis”. Mas aí vem a esperança de que a gente talvez se encontre numa curva do tempo, numa quebrada dimensional, numa outra vida! E vem mais forte do que nunca, a vontade de sentar com mestres que estão entre nós como Primaggio Mantovi e Rodolfo Zalla e tomar “aquela” cerveja, bater “aquele” papo, como fizemos na saída do Festão do Baraldão, no Woodstock Bar em Sampa. E homenageá-los, que eles merecem!
EUGÊNIO COLONNESE
Fui apresentado a Colonnese na primeira Fest Comix (na calçada da Comix, em Sampa), 30 anos depois de estudar em livros de Geografia belamente ilustrados por ele, onde um ET mostrava de sua nave, o planeta Terra (vejam que ironia) a quatro crianças terráqueas. Depois reencontrei seu traço lindamente pincelado com nanquim nos vários álbuns (Mirza, a vampira, O espírito da Guerra, A arte exuberante de desenhar mulheres, O morto do pântano), lançados pela Opera Graphica, sob a batuta de Franco de Rosa, além das revistas que ensinam a desenhar, editadas pela Escala. Franco de Rosa e Zalla me disseram que Colonnese adorou a caricatura que eu havia feito dele na primeira Pizzada dos Cartunistas, em 1999. “Foi a melhor caricatura que já fizeram de mim. Faço questão que entre na coletânea de Terror que vamos lançar.”
GEDEONE MALAGOLA
Conheci seu trabalho, quando em 1977, ganhei do Jayme Cortez o Livro A Técnica do Desenho. Gedeone era um dos 25 convidados por Cortez para ensinar Quadrinhos, em seus mínimos detalhes. A HQ publicada no livro, em que um rapaz desencarna e não sabe, é fantástica. Ele sempre dominou muito bem o roteiro, mantendo o suspense até o fim. Usa até desenhos esboçados, uma bela metáfora em relação à construção material dos corpos das pessoas. Neste livro, os personagens infantis também me chamaram a atenção, principalmente "Meio-fio" que contou com ótima arte-final. Depois fui achando revistas do Raio Negro em sebos. Mas o que sempre me agradou no desenho de Gedeone, foram seus ângulos inusitados, perspectivas interessantes. Mesmo com um desenho e arte-final despojados, é fácil perceber o esmero na construção do cenário e na colocação dos personagens como Raio Negro, Hydroman, Homem-Lua. Minha mais grata surpresa foi a recente republicação de seus Quadrinhos pelas editoras SM e Júpiter. Esta caricatura foi publicada na revista Mundo dos Super-Heróis, onde ele escrevia uma coluna.
CLAUDIO SETO
Conheci o trabalho de Seto, o grande Samurai dos Quadrinhos através das revistas Maria Erótica, o Samurai, Ninja Negro, Flavo e muitas outras. Ele sempre surpreendeu pela velocidade no traço, leveza na linha de ação, além do erotismo, é claro! Quem quiser ver a HQ (publicada na Front-Japão, Via Lettera) em que homenageei este grande criador, acesse este link. E depois clique em “próxima” pra ler a HQ inteira (8 páginas). Leia aqui a entrevista que originou a minha HQ. Segue mensagem que ele me enviou em 29/07: “Oi Bira, obrigado pela acolhida em São Paulo. Li sua história e gostei. É uma sensação nova me ver como personagem de quadrinhos, quando sempre estive do outro lado da prancheta”.