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Por Cadorno Teles 08/05/2008
O ano é 1565, a cristandade estava ameaçada em suas fronteiras, ao norte, pelo avanço dos protestantes e ao sul, a dominação muçulmana. O grande cerco de Malta está próximo de seu início, mais um terrível conflito entre a cruzada cristã e a jihad islâmica. A ilha seria cercada por um enorme exército, reunido por Suleiman, o magnifico, em uma porcentagem de 10 otomanos para um cristão. Willocks usa a História para compor um dos melhores livros já lançados sobre o final do período medieval e início da era moderna. Temos o feudalismo e sua hierarquia, a reforma protestante, a entrada da Inquisição como resposta, o uso da pólvora, ao mesmo tempo de espadas, sabres, lanças e óleo fervente. O título do livro A Religião refere-se ao nome que se dava informalmente pra os Cavaleiros de São João Batista, os Hospitalários, o melhor dos melhores cavaleiros, a última força especial da Igreja Católica, remanescente do período que a cristandade tinha o poderio na Terra Santa. O protagonista da narrativa, Mattias Tanhauser, um mercenário ateu, que possui amizades importantes nos dois lados da batalha, e ronda o conflito na perspectiva de comercializar armas e ópio para ambos os lados, satírico, típico de Rabelais, um Saxão robusto e aventureiro. Após matar os assassinos de sua mãe e irmãs, foi criado por um nobre cavaleiro das forças turcas, tornando-se um capitão dos janízaros, a força de elite do Império. Ele chega a Malta, acompanhado por seu amigo de armas, Bors, pela condessa Carla La Penautier e a estranha espanhola Amparo para encontrar o filho bastardo da bela senhora. Tanhauser se envolve com as duas, com a doce e belíssima Carla, um caso romântico recatado, e com a espanhola, que tem a capacidade de ler o futuro, um caso sexual e selvagem. A chegada de Mattias em Malta é aguardada pelo Cavaleiros Hospitalários, pois conheciam seu passado e como era famoso pelas suas estratégias de combate e informações sobre os inimigos. Além dos inimigos turcos, a procura pelo garoto se complica, quando o pai do menino, Ludovico Ludovici, um monge inquisitor, poderosa figura de Roma, dedicado a erradicar qualquer transcrição herética. Os personagens, heróis e vilões, cada qual acreditando e convencidos que seus inimigos são os inimigos de sua religião, encarnações do Mal. Willocks usa em seu cenário uma reconstituição nua e crua. As cenas de batalhas são sanguinolentas, são descritas sem nenhuma piedade, como são na realidade as guerras. A vida cotidiana em uma cidade medieval sob um cerco se transforma, de uma simples "vidinha" à incrível matança de cachorros, para que os animais não se alimentem dos mortos; é só um exemplo de como o autor britânico retrata a época. A descrição de cada momento do cerco, além das aventuras de Tanhauser, é mostrado como uma infusão de sentidos: cheiros, cores e sons são colocados a cada esquina, a cada flor e entranhas encontradas ao longo do cerco, ao ouro e às bandeiras coloridas em contrapartida aos campos de sangue e podridão, a doce música ao rugir dos canhões. Tudo é colocado com maestria, reunindo um panorama sem igual para a cidade sitiada e aos personagens históricos e ficticios. Além de ser um ótimo épico, A Religião propõe, apesar das cenas cruéis, uma modelada crítica ao fundamentalismo hostil e militante de antes e de hoje. Com certeza, merece se tornar um filme; criado a partir de fontes históricas, livros de ficção e até mesmo graphic novels, o livro usa clichês, mas é abordado de maneira crua, que poderá até ser criticado como um culto da morte. Um épico, com brio literário que lembra os melhores romances históricos e que com certeza irá agradar qualquer público, pela fabulosa reconstituição e por ser só o primeiro livro de mais uma aguardada trilogia.
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