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Entrevista: Fábio Sales
Por Marcio Baraldi
02/05/2008

Os Quadrinhos invadem a TV!

Fabião entrevistando galera do Menino Caranguejo

Esta entrevista é parte de uma série intitulada Os Quadrinhos invadem a TV!, que mostrará os três programas sobre Quadrinhos e afins que atualmente são produzidos no Brasil e veiculados em TVs e web TVs. Trata-se de uma marco no mercado de HQs brasileiro! Nunca antes tantos programas sobre o assunto foram produzidos, e todos 100% nacionais, desenvolvidos por profissionais de Quadrinhos e/ou apaixonados pela Nona Arte. E o que é melhor: não se trata de uma febre passageira, os programas sobre Quadrinhos realmente  vieram para ficar! Prova disso é que o mais veterano dos três, o HQ Além dos Balões, já possui mais de três anos no mercado. Para iniciar esta série exclusiva, o Bigorna.net bateu um papo com Fábio Sales, um publicitário e ex-dono de gibiteria que criou em 2005 o programa HQ Além dos Balões, produzido semanalmente e veiculado na web TV Tatuapé, onde pode ser assistido a qualquer hora no site da emissora. Lá estão disponibilizadas todas as edições produzidas até o momento. Nas próximas semanas será a vez das entrevistas com Rodrigo Febrônio, do Banca de Quadrinhos (Canal de São Paulo) e César Freitas, do HQ & e Cia (All TV). Enfim, preparem as pipocas e aconcheguem-se em suas poltronas preferidas, caros leitores, porque, como diria o Rei Roberto: "Daqui pra frente, tudo vai ser diferente!". Os Quadrinhos invadiram a TV brasileira. E de lá ninguém os tira mais!!!

Você já tem um envolvimento com Quadrinhos de longa data, não? Você teve uma loja de Quadrinhos em Campinas. Quando e como foi esse teu negócio?

É isso mesmo, Baraldi, meu envolvimento com Quadrinhos vem desde que aprendi a ler, ou acho que até antes, pois meus pais dizem que desde criancinha eu ficava folheando as revistas. Sempre gostei de HQs e comecei com Disney e Mônica, depois passei para os super-heróis e fui ampliando cada vez mais os horizontes até os Quadrinhos de autores e undergrounds. A minha loja se chamava Legends & Lore e trabalhávamos com Quadrinhos nacionais e importados, além de RPG. Na época era a única loja do gênero em Campinas (existia uma banca também, acho que perto da PUC). Além do acervo de revistas, fazíamos apresentações de RPG também, a galera ficava jogando em umas mesas espalhadas pela loja. Quase todo nosso acervo vinha através da Devir e aí pude conhecer autores e histórias que não eram traduzidos na época, o que me ajudou a conhecer um pouco mais deste universo que adoro.

Você é um dos donos da web TV Tatuapé. Quando vocês a fundaram? A idéia inicial era prestar serviços para o bairro do Tatuapé (Zona Leste de São Paulo)?

Na verdade, o proprietário da TV Tatuapé é o Flávio Peixoto que possui uma produtora, a AF Digital. Esta produtora é parceira de minha empresa de Comunicação, a Grupo Central de Comunicação e Marketing, e como já havíamos trabalhado juntos em um outro projeto de minha empresa, o ImegaTV (programa para divulgar bandas independentes no Canal de São Paulo da TVA), ele me convidou para produzir um programa sobre Quadrinhos na TV Tatuapé. Como o estúdio da TV fica no mesmo endereço de minha empresa, acabamos tocando vários projetos juntos. Realmente a idéia inicial era prestar serviços para o bairro e zona leste, porém o Flávio consegui ampliar o alcance da TV Tatuapé agregando esta grade de programação variada e que é de interesse, sem ser megalomaníaco, do Brasil como um todo, pois são assuntos gerais. Então diria que nossos tentáculos estão se espalhando por aí... A TV Tatuapé teve início em novembro de 2005, juntamente com o início dos trabalhos da produtora do Flávio.

Você acredita que as webTvs são o futuro da TV no planeta? Elas seriam um contraponto democrático as Tvs abertas, tão distantes dos anseios populares?

Veja só, com o conhecimento que temos hoje, pode-se dizer que o futuro seja a proliferação das web TVs, pois são um veículo realmente mais democrático, tanto no sentido da variedade de conteúdo, quanto na oportunidade de acesso pelos interessados. A característica da TV Tatuapé é a de que os programas estão em arquivo, você assiste à hora que desejar, não existe uma grade rígida, pois isto seria ir contra os benefícios da Internet. Putz, se você acessa um site a hora que quer, porque na hora de assistir a um, digamos assim, web programa de TV, você teria que ter um horário pré-determinado? Seria uma contradição. Então o Flávio e nós produtores mantemos esta linha de programas atuais e anteriores em arquivo. Clicou, assistiu, à hora que quiser. E este deve vir a ser o padrão adotado pelas outras web TVs, pois como você disse, é a grande oportunidade para o público assistir o que e quando quiser aos programas mais variados, sem limites.

O HQ Além dos Balões foi o programa que inaugurou a TV Tatuapé? Como surgiu a idéia de criá-lo? Você já tinha vontade de fazer um programa de Quadrinhos faz tempo?

A TV Tatuapé estreou com o programa Mask, de rock e cultura gótica, produzido e apresentado pelo DJ Penna e também com os vídeos produzidos para os clientes da região. Nós estreamos em janeiro de 2006, precisamente e de propósito no dia 30, dia do Quadrinho nacional. E vocês sabem entrevistando quem?!? Pois é, este maluco que me entrevista (risos). Estreamos falando da revista O Tico-Tico e entrevistando o cartunista "mais rock&roll" do Brasil. E para minha estréia, foi fácil e difícil ao mesmo tempo, pois conversar com o Baraldi é muito fácil, interrompê-lo é que não é (risos). Quando o Grupo Central produzia o ImegaTV, acabei criando um quadro de lançamentos na área de Quadrinhos que tivessem ligação com a música e no site do programa eu escrevia uma coluna fazendo esta relação. Daí para o convite do Flávio foi só dizer sim, pois sempre quis falar e divulgar esta forma de arte, como leitor que sou e como incentivador que me tornei. Aliás, você, Baraldi tinha presença constante lá no ImegaTV, pois sua ligação com os Quadrinhos e música é bem conhecida.

Tem gente nesse mercado de HQs que é muito desanimada e acha que nada dará certo nunca. O HQ Além dos Balões já completou três anos e está crescendo cada vez mais. O que você diria para essas pessoas que não botam fé em nada que e nacional? Qual o segredo pra crescer e progredir nesse mercado de Quadrinhos?

Cara, como qualquer atividade, nada é fácil. Tem que ralar muito e se conscientizar que poucos lhe darão crédito. O HQ Além dos Balões está completando três anos de veiculação com o esforço e suor inteiramente nosso. A ralação do Flávio (que é o câmera, o editor e o diretor) e minha (que produzo e apresento) é total, porém quando o programa vai ao ar, nossa satisfação é imensa. Como é imensa nossa satisfação agora em ter a colaboração da Carol Miss, que apresenta o quadro Notícias do 4º Mundo e auxilia o Flávio nos outros programas. Ter a presença de uma profissional do Rádio e TV em nossa equipe nos dá a certeza de estarmos no rumo certo. Veja só, nós dois temos nossa atividade que nos remunera, a produtora e a empresa de comunicação. O HQ Além dos Balões é uma atividade paralela, mas que devido ao seu crescimento vem exigindo cada vez mais de nós. E não reclamamos por causa disso, estamos cada vez mais motivados. O programa possui as mesmas características de uma produção independente, só temos nosso próprio apoio. Dizer qual o segredo para progredir é difícil, mas com certeza tem que ter ralação, ter dedicação, gostar do que se faz, buscar informação. Buscar parcerias é um ponto essencial, cara, você deve unir forças com aqueles que tem os mesmos objetivos que você, sem vaidades. Pesquisar e se atualizar sempre, também são ações necessárias.

Nesses três anos quais foram as maiores dificuldades que você enfrentou? Você encontrou pessoas que lhe apoiaram?

Começo pelo apoio, nada faria se não fosse o apoio do Flávio, que acreditou no projeto e me suporta até hoje (risos). Muitos de vocês o conhecem, é aquele cara atrás da câmera. Outro que nos dá uma força é o DJ Penna, que de vez em quando está conosco nas externas e até abriu um espaço em seu programa Mask para os Quadrinhos. Além disso, minha esposa Fabiana e meu filho Daniel, de 6 meses, também me liberam para entrevistas noturnas ou nos finais de semana (risos), além da Kátia (gerente de minha empresa) que também acaba dedicando um tempo para o programa. Agora, entre o pessoal do meio dos Quadrinhos, tenho que agradecer muito o apoio do site Bigorna e ao Eloyr Pacheco, que sempre nos dá sugestões e divide um pouco de seu conhecimento conosco. À Francesca, da Devir, e a você também, Baraldi, que tem nos dado uma força legal, tanto concedendo entrevistas e material como divulgando nosso trabalho. Falar em nomes é complicado, pois sempre você acaba deixando alguém de fora, então agradeço a todos que marcaram presença no programa, como por exemplo (e apenas para dar exemplo, pois muitos outros compareceram) o Marcatti, o Spacca, o Jal, o Gualberto, o Worney, o Will (que está tendo um trabalho enorme em reunir as novidades do 4º Mundo para o quadro apresentado pela Carol), o Floreal, o Bira Dantas, sei lá, é muita gente que ao nos conhecer nos incentiva a continuar, nos dão dicas ou enviam material para fazermos resenhas (afinal também devemos informar o público sobre os lançamentos). Claro que também temos algumas dificuldades, como conciliar as datas de produção e entrevista com meus compromissos profissionais e manter a freqüência desses trabalhos. Dificuldades financeiras, então, quem não as têm? Estamos à procura de patrocínio e publicidade, aliás, alguém aí quer comprar espaço (risos)?...

E quais foram as maiores alegrias? Quais as matérias que você realizou que lhe deram mais satisfação?

Pô, além do nascimento do Daniel, meu filho, a maior alegria é o programa estar aí no ar, firme e forte. É ver que os profissionais da área acreditam em nossa proposta e nos atendem quando solicitamos. É ver que estamos evoluindo na produção do programa. Acho difícil dizer qual matéria me deu mais satisfação, porque aprendi muito com todas elas, e como sou um apaixonado por HQs e cartuns, ter esse contato com a Nona Arte atrás dos bastidores é sensacional. Agora, lógico, entrevistar os caras que foram e são meus ídolos nessa área é bem gratificante, como ter a oportunidade de conversar com o Angeli, o Laerte, o Ziraldo, o Jaguar, o Spacca, o Paulo Caruso foi demais! Uma série de programas que nos deixaram muito satisfeitos foi a cobertura da semana de inauguração da Menor Livraria do Mundo, no Jeremias, o Bar, a cobertura da Bienal do Livro, as entregas dos prêmios Angelo Agostini e HQ Mix. A criação e veiculação do quadro Notícias do 4º Mundo, também nos deixou muito felizes pois nos possibilita divulgar e conhecer ainda mais o Quadrinho independente nacional, dar espaço para eles. Isso tudo é muito  gratificante!

A seu ver, por que as grandes emissoras de TV nunca se interessaram por Quadrinhos e nunca fizeram um programa como o seu, se o Brasil sempre foi um grande consumidor de HQs?

Pois é, realmente eu me pergunto isso todos os dias. Será porque não interessa a elas a disseminação da cultura escrita? Será porque as editoras não têm bala suficiente para pagar jabás e aparecer na programação? Será porque, como os demais veículos de comunicação, os produtores e executivos não conhecem e não querem conhecer o assunto? Será porque o tempo que você dedica à leitura, você não está na frente do aparelho de televisão? Afinal,o que querem as grandes emissoras de TV? Cidadãos conscientes e alfabetizados, que saibam argumentar e digerir uma informação é que não é.

Se você ganhasse um milhão de reais do BigBrother (risos), o que você faria? Que investimento você faria no teu programa e na tua web TV?

Isto é provocação, falar em Big Besteira (risos)!... Acho que eu entraria no satélite e detonaria a transmissão desta Big Porcaria, putz, isso sim, seria uma grande realização (risos)... Na real, com esse um milhão de reais, com certeza investiria em mais equipamentos e estrutura de profissionais. Sabe, tipo correspondentes em vários estados para cobrir os diversos Salões de Humor e difundir as produções de Quadrinhos regionais. Aumentaria a capacidade do servidor para suportar programas com uma definição igual à da TV digital. Sem pieguices, montaria uma escola para meninos e meninas carentes aprenderem a produzir Quadrinhos (algo como a editora Uirapuru faz) ou a produzir Rádio e TV. Imagina o poder que estas crianças têm para produzir cultura, é só dar espaço para viajarem. Ainda sobrou dinheiro? Caso sim, iria ter a maior biblioteca de Quadrinhos que pudesse, aliás acho que vou dar uma desviadinha nesta grana (risos)...

Você, que acompanha gibis desde garoto, como vê o mercado de HQs hoje? A Internet roubou muito do público leitor de gibis, não? Você foi esperto e já começou na Internet, né (risos)?

Cara, isso é bem polêmico! Em minhas entrevistas fiz estas perguntas para diferentes pessoas e sabe à qual conclusão cheguei? Que esta é uma grande polêmica (risos)! Será que foi a Internet que roubou público leitor ou foram as condições de ensino? Esta história de educação continuada e aprovação automática que inventaram nas escolas públicas e que algumas particulares seguem veladamente é um crime imenso. É uma hipocrisia e uma falta de senso impressionante, o aluno não repete mais, então vai se esforçar para quê? O analfabetismo está sendo institucionalizado, e a culpa é nossa que não tomamos uma atitude enérgica e imediata. Cara, a criança mal sabe ler e vai passando de ano. Quando chegar no ensino fundamental, como poderá ter condições de entender matemática simples, concordância verbal? Aí chega no colegial, como vai interpretar um texto mais complexo? Como vai se preparar para votar? Agora, por outro lado, escrever no orkut e inventar uma nova língua, aí pode. Por que então, no vestibular, as questões de gramática não se baseiam no orkut? A Internet está aí para quem quiser, cara. Ler no monitor ou ler no papel não importa, contanto que as regras gramaticais sejam seguidas. Agora, para as editoras e autores, o papel significa remuneração. Como remunerar pela Internet? O papel (sem trocadilhos) da Internet como fonte de divulgação é imenso e deve, sim, ser explorado, como vem sendo. Outro ponto nesta discussão é a situação das bancas de jornais, que hoje em dia, são bancas de mascates. Vende-se de tudo e em muita quantidade. Como encontrar o que você quer com facilidade? Impossível! O próprio dono ou funcionário da banca não tem mais condições de indicar ou até mesmo saber o que tem na banca. E isso é um problema social, eles têm que sobreviver e para isso vendem o que puderem para faturar, fazer o quê? As assinaturas de jornais e revistas já mostravam que as bancas deveriam que diversificar e os Quadrinhos perderam seu espaço. Aí é que a Internet acabou se aproveitando, mas volto a questionar, como remunerar os artistas que publicam na Internet?!?

E, afinal, quais seus Quadrinhos e autores preferidos? Tem algum mestre que você sonhava entrevistar e já entrevistou? E algum que você ainda sonha entrevistar?

Meus preferidos são aqueles que posso ler (risos)!!! Cara, meu gosto é muito diluído, igual ao meu gosto por música. Gosto muito de Quadrinhos autorais, de tiras humorísticas, leio de tudo. E agora,por conta do programa, tenho que ter contato com tudo que me for possível. Como disse anteriormente, ter entrevistado aqueles caras foi demais, espero um dia poder entrevistar o Neil Gaiman, Mauricio de Sousa, Luiz Gê, Chico Caruso, Shimamoto, etc. E, putz, como gostaria de ter entrevistado o Will Eisner, cara!!! Teria sido duca!... Agora, um apelo pessoal que eu faço às editoras: REEDITEM MORTADELO E SALAMINHO (risos)!!!! Estão esperando o quê para isso, pô?!?...

Quais seus planos e projetos para o presente e futuro?

Cara, um dos projetos é o de criar uma rede de correspondentes nos vários estados. Em breve vai entrar no ar o site próprio do programa com espaço para várias manifestações dos artistas nacionais. Um de nosso planos para o presente, para podermos ter um futuro, é que os patrocinadores e anunciantes nos descubram e invistam em nós. Quero terminar agradecendo a você, Baraldi, por esta oportunidade e ao Bigorna por mais este espaço. E a vocês artistas, por me proporcionarem ótimos momentos de lazer. Grande abraço a todos!

O Bigorna.net agradece a Fábio Sales pela entrevista, concedida em 28/04/2008
      
(foto: Marcio Baraldi)

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