Philip K. Dick, ícone da literatura psicológica, ou será do gênero ficção científica psicológica? Um autor que em vida não teve o reconhecimento por suas obras, mas ao longo da década de 1980 aos dias atuais, o Cinema roteirizou várias, que se tornaram grandes sucessos de público, como Blade Runner, o caçador de Andróides ou o recente O Homem Duplo, com o Keanu Reeves. Seus livros possuem temas variados, desde contos, estudos teológicos, eróticos, entre outros, mas que antagonizam os momentos vividos pelo autor. Dick escreveu todo tipo de literatura, mas ficou conhecido pela sua ficção cientifica e pelas questões filosóficas que cercam a ciência, plantando em muitas ocasiões histórias que parecem brotar da mente de um paranóico.

Chega ao Brasil uma das últimas e melhores obras escritas por Dick, VALIS (304 págs., R$ 44,00), pela editora Aleph, com tradução de Fábio Fernandes, um livro que mostra, de maneira mais decisiva, um dos momentos mais cruciais de sua vida: o fim e o seu encontro com Deus. Dick morreria em 1982, quatro anos depois de escrever a trilogia que se inicia com VALIS - editado pela primeira vez em 1981, se desenvolve com A Invasão Divina (1981) e finaliza com A Transmigração de Timothy Archer (1982).

Uma trama única, com estrutura e técnicas empregadas que dão a VALIS o título de livro mais comentado da literatura de ficção cientifica moderna. A narrativa se passa no ano de 1978, durante a explosão hippie e a dance music; Dick é o narrador e personagem da história, mas o protagonista é o seu amigo e alter ego Horselove Fat. Um melancólico e obsessivo homem que, após a perda de duas pessoas queridas, tem um encontro revelador, por meio de um feixe de luz cor-de-rosa, e a partir daquele dia, começa a analisar e entender as escrituras sagradas como ninguém, os mais complexos fundamentos da filosofia, os segredos dos pergaminhos do Mar Morto, os eventos de sua vida – como no caso da doença de filho - e de seus amigos, terminando por escrever uma complexa exegese de sua própria visão de mundo.

Logo Fat se convence de que uma entidade superior, que todos chamamos de Deus, que já foi Buda e Jesus, está para nascer a qualquer momento, e ele não vai descansar enquanto não encontrá-lo. Em sua procura, Fat entra em contato com outros que são iguais a ele, que têm o acesso a toda informação através de VALIS – Sistema de Vasta Inteligência Viva, no original, Vast-Active-Living-Intelligence-System. E Horselover descobre que Deus não é uma entidade superior transcendental, mas que poderia ser um alienígena perigoso e muito poderoso. A narrativa nos leva, junto com o personagem principal, o narrador, à mistura que Dick faz em VALIS. Loucura, paranóia e iluminação divina; uma exposição sincera do pensamento do autor, considerado louco, mas que entremeia discussões e pensamentos filosóficos e teológicos com uma boa dose de esquizofrenia no meio.

Uma reflexão de VALIS, com suas teorias de conspiração, filosofias e teologias, necessita de uma leitura detalhada, investigativa e questionadora. Uma obra de arte, o melhor livro de Dick, um livro para se ler mais de uma vez.