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Por Gonçalo Junior 28/08/2006
Na década de 1980, um dos mestres dos Quadrinhos brasileiros, Flávio Colin (1930-2002), criou um personagem que não chegou a desenhar: Copyright Kid. Foi a forma encontrada por ele para representar a opressão de sua classe diante de algo que sempre lhe pareceu intransponível: a dominação das distribuidoras de tiras de jornal, organizadas e conhecidas como syndicates, que dominaram o mercado da América Latina pela venda de Quadrinhos a um número grande de jornais por um preço baixo. Ganhava-se na venda pelo atacado. Espécie de vilão, o cowboy Copyright Kid vivia à espreita para liquidar qualquer pretensão de quem tentasse abrir mercado para os Quadrinhos Nacionais. Colin era um idealista e uma exceção. Talentoso, reconhecido como um dos mais autênticos desenhistas do século, culto, conhecia como poucos o folclore e a literatura nacional e a própria linguagem dos Quadrinhos. Escrevia bons roteiros e jamais deixou de aperfeiçoar a técnica, embora tivesse um traço personalíssimo. O artista fazia parte da terceira geração de desenhistas de Histórias em Quadrinhos, surgida nos anos de 1950 e que atuaria com surpreendente organização até 1964. Mobilizados em São Paulo e Rio de Janeiro, eles lutaram por uma lei que obrigasse as editoras a publicarem 66,6% de Histórias em Quadrinhos brasileiras. Chegaram perto disso. Primeiro, em 1961, o presidente Jânio Quadros comprou a briga e elaborou um projeto, mas renunciou antes de baixá-lo. Dois anos depois, um decreto de João Goulart atendeu à polêmica reivindicação. O golpe militar, no entanto, impediu que a lei fosse regulamentada.
Na verdade, esse argumento continua a ser usado em 2005 para justificar a incapacidade de competir com a produção americana. Apesar de ter uma tradição de excelentes desenhistas, o Brasil peca no descaso que sempre deu ao processo de produção como um todo. Em especial, no que se refere a roteiro. Esse é o maior problema dos nossos Quadrinhos: não dominamos as bancas porque não sabemos escrever boas histórias. Há 70 anos é assim. Numa autocrítica necessária, deve-se reconhecer o amadorismo que tem alimentado grande parte da produção nacional. Existem as exceções iluminadas, obviamente. Boa parte dos desenhistas nunca deu a menor importância ao conteúdo, à elaboração das tramas. Desprezam completamente esse suporte no processo de criação, individual ou coletivo, quando se sabe que a elaboração artística se dá num contexto de muitas referências: vivência, conhecimento erudito e popular, leitura de livros, jornais e revistas, filmes, etc.
Os quadrinhistas brasileiros apenas se lamentam, ao invés de enfrentar o Copyright Kid com as mesmas armas. Mauricio de Sousa, que conseguiu vencer o vilão americano, não é apenas um caso de sucesso empresarial. É mais que isso: ele foi o primeiro artista a criar uma mentalidade profissional de produção competitiva no Brasil. Ofereceu produtos de nível para que o leitor pudesse escolher. A mesma mentalidade transformou a Editora Abril num dos principais produtores de Disney do mundo. Nenhuma lei ou governo conseguirá resolver esse problema porque o leitor quer ler boas histórias. Enquanto isso, Copyright Kid continua mais veloz no gatilho. A seguir: o que uma capa pode ou não fazer por um gibi ou livro |
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