Como surgiu a idéia
|
O SESC Bonfim de Campinas no traço de Bira |
Meu amigo jornalista e pesquisador da história da caricatura
João Antônio Buhrer sempre me instigou a retratar Campinas em meus desenhos. Ele reclama dos cartunistas que só retratam os políticos e deixam o cenário de fundo como um traço de rodapé. Eu, que já era fã, estava muito impressionado com o detalhismo do
Angelo Agostini (cartunista ítalo-brasileiro, primeiro a fazer HQ no mundo e inspirador do prêmio da AQC-SP); assisti ao vídeo produzido pela TV Senado. Assim, debrucei-me mais ainda sobre o trabalho deste desenhista impressionante, chargista feroz dos tempos de
D. Pedro II, da Campanha Abolicionista e do surgimento da cerveja Bohemia. Algumas ilustrações minhas fizeram parte da exposição sobre a Abolição da Escravatura no Colégio Carlos Gomes. Vendo a história dos nomes das ruas que pertenciam a políticos, fazendeiros e advogados, caiu uma ficha: contar a história da cidade pelos nomes das ruas e praças. Eu me sentiria um pouco Angelo Agostini; Campinas foi uma das últimas cidades do país a aceitar o fim da escravidão. Assim, desafiado pelo amigo João Antônio e querendo homenagear o
Toninho (prefeito assassinado), resolvi fazer uma coleção de 13 cartuns com uma visão bem-humorada dessa cidade que abracei como minha, desde 1988.
As andanças
Morei no Nova Europa, Cambuí (onde montei uma Locadora de Vídeo, Bar&Gibiteca, com minha mulher, Cláudia) e atualmente moro no Botafogo. Durante todos esses anos cruzei muito as ruas do Centro, conhecendo figuras impagáveis como o falecido Mané Fala Ó, Bozó, Lótus, O Politizador e tantas outras figuras anônimas que recheiam nossa imaginação com suas história e atitudes. Foi cruzando ainda as ruas do Proença, onde fazia aula de guitarra com o Celso, ex-guitarrista e vocal da banda de Rock´n roll Drive in; do Centro, quando escapava do Sindicato dos Eletricitários (onde fazia charges) na Dr. Quirino para ir às lojas de Discos Rock Records, 220 Voltz, Colors, Hully Gully, Sebo e Lojão, Pulsar e Iluminações, indo à cata de livros de Quadrinhos e preciosidades do Blues – meu gênero preferido graças à intervenção do também quadrinhista Marcatti - tomando uma cerveja e fazendo caricaturas no Bar do Thom, na José Paulino perto do Mercadão; na V. Industrial, quando trabalhava no Diário do Povo; dando voltas corridas no Taquaral com minha companheira, indo dar aulas na Pandora. Assim a idéia de desenhar a cidade foi amadurecendo.
Como faço os cartuns de Campinas?
Depois de escolher o lugar que vou retratar, escolho o ângulo e estudo os prédios que vou caricaturar. Desenho tudo na hora ou fotografo pra poder trabalhar melhor os detalhes. Faço um estudo da perspectiva. Não sou um perfeccionista, até porque não sou arquiteto, mas gosto de seguir regrinhas básicas de ponto de fuga, linhas convergentes, divergentes e paralelas. Como são cartuns, gosto de dar uma "forçada" e abaolada nas linhas, coloco os personagens que cruzam nossos caminhos todos os dias e passo pra arte-final. Na fase "grafite", uso lapiseira 0.7 mm e grafite 2B. Uso canetas de nanquim descartáveis 0.5 mm e 0.3 mm, caneta futura ou retroprojetor preta. Xeroco e pinto com aquarela. Mesmo o jornal sendo preto e branco, o colorido passa para tons de cinza, enriquecendo os desenhos, que pretendo publicar em forma de gravuras. No Photoshop trato a imagem mexendo nos níveis, reforçando os tons e clareando os fundos.
Abaixo estão os textos que acompanharam cada Cartum publicado no MeuJornal Campinas (clique em cima dos nomes – ex.: Cartum II - para ver a imagem) e também o que retrata a cidade de Bucheon, na Coréia do Sul. (N.do E.: 3 dos cartuns não contém links porque não foram postados nos blogs do artista)
Cartum I
“A partir da primeira edição, o MeuJornal Campinas tem publicado uma coletânea de ilustrações produzidas pelo chargista Bira, colecionador de inúmeros prêmios nacionais e internacionais, com sua visão bem-humorada da cidade que ele abraçou como sua, desde 1988. Ele colabora com o Sindicato do Energéticos e Petroleiros, com a agência de produção gráfica Grafos e publicou charges e ilustrações no Diário do Povo e Anglo. Dá aulas de caricatura, charge e cartum na Escola e Livraria Pandora em Campinas. Nasceu em São Paulo, no ano de 1963. Desde 1979 se dedica às HQs e de 82 pra cá, publica charges diárias em panfletos, boletins e jornais da imprensa sindical e alternativa”.
(Paulo de Tarso, o editor do MeuJornal Campinas)
Cartum II
No Beco do Diabo
“Encontro o Bira no Nosso Bar e ele me pede para escrever alguma coisa para ilustrar uma charge sua. Esta que o raro leitor ora vê. É meio que complicado escrever sobre aquilo que o olho está vendo e por si se explica. É aquela velha frase: a imagem vale por mil palavras - se bem que para explicar isso a gente tem que usá-las. Mas tenho dúvidas quanto aos riscos do meu analfabetismo emocional. Bira me conta que a cena ora retratada foi vista de uma janela do Sinergia - que não aparece na charge, é claro. Na charge, os carros descem a Rua Dr. Quirino na contramão. Tudo bem, chargistas sempre caminham na direção oposta e, por algum milagre que desconheço, se fazem entender.
O Bira, por uma sutileza, digamos, malandra, nos mostra um pequeno trecho da Rua Luzitana. Não mostrou mas eu descubro com a memória a Travessa São Vicente, mais conhecida nos antigamente como o Beco do Diabo. Era ali onde os jovens que saiam dos bailes do Cultura costumavam pecar com as suas sonhadoiras efêmeras namoradas. Mais tarde, virou Beco dos Trombadinhas. E vou parando por aqui porque um velho coração está começando a dar trombadas atravessadas na memória, advinda de uma linda menina de olhos azuis que morava num simpático prédio de tijolinhos a vista.
Até agora, utilizei palavras para descrever a paisagem do Bira. E se paro por aqui, repetindo, é só por causa de uma saudade que, além de farta, se revelou analfabeta de pai e mãe”.
(Escrito por Zéza Amaral, jornalista)
Cartum III
Catedral e Rua 13 de Maio
Escrevi sobre a morte de Will Eisner e da entrevista que ele concedeu ao Pasquim. Com o Ziraldo liderando a conversa, ele contou de um ajudante que teve: André Leblanc, haitiano que foi desenhista do Fantasma e morou no Brasil, quando ilustrou livros de Monteiro Lobato e revistas da Ebal. Eisner influenciou muitas gerações de quadrinhistas e chargistas, com sua forma teatral/cinematográfica de contar histórias empolgou até cineastas de renome como Fellini.
(Escrito por mim)
Cartum IV
Estação Cultura
No quarto poema-desenho-homenagem à cidade de Campinas resolvi caricaturar não só o magnífico prédio da antiga estação de trem da Fepasa, atual Estação Cultura - como as figuras ilustres e musicais que passaram por lá. A começar do meu e de quem mais quis - amigo PT Toninho 13. Foi o amor deste “pequeno grande homem” por uma cidade que já foi caminho de Bandeirantes, que me inspirou a fazer os 13, ou mais, cartuns-Ode a Campinas. Se Martin Luther King teve um sonho, Toninho também o teve e o estava praticando quando, na noite de 10 de setembro de 2001, uma bala malfazeja nos privou de sua companhia neste chão que pisamos todos, com todas nossas cores, credos e times preferidos. Mas isto não impediu que um de seus sonhos se concretizasse: em 11 de agosto de 2002, foi inaugurada a Estação Cultura, 130 anos depois da primeira viagem de trem entre Campinas e Jundiaí. Toninho, tal qual um maestro, sonhava em fazer da velha estação abandonada de trem, palco da vida, transbordante de sons e tons, tornando a cultura da boa música, do bom encontro, da boa troca de idéias e ideais algo assim como um velho conhecido. Um velho companheiro. Por lá passaram exposições russas e não russas, apresentações de teatro, capoeira, mamulengos, eventos ligados à Consciência Negra, homenagens a Adoniram Barbosa, aos ferroviários, ao samba, e shows de gente como Demônios da Garoa, Lobão, Tom Zé, Leila Pinheiro, a “nossa” sinfônica, Mestre Ambrósio, Jorge Mautner, Paulinho da Viola, Dona Ivone Lara, Elza Soares, Belchior, Mestre Salu, Antônio Nóbrega, Geraldo Azevedo, Zé Renato, Nelson Sargento, Chico César e tantos outros. E também foi palco de protestos contra a impunidade no assassinato do Toninho, contra qualquer tipo de discriminação: raça, credo, sexo ou gênero e contra a falta de humor. Porque o bom humor é essencial, além de desopilar o fígado, dizem os entendidos! Por isso, muito bom humor a todos!
(Escrito por mim)
Cartum V
Uma guerra esportiva separada por apenas uma avenida
“Um clube nasceu em 1900 a partir do sonho de um grupo de garotos. Onze anos depois, novos campineiros cheios de esperança e entusiasmo no futebol homenagearam o filho mais ilustre da cidade com a criação de uma nova agremiação com o nome da composição mais famosa de Carlos Gomes. Pronto. A rivalidade entre Ponte e Guarani estava estabelecida e com o passar do tempo transformou-se em ponto turístico do município. Ponto turistico, sim senhor. Afinal, como esquecer as estripulias da folclórica Conceição pelas ruas com a única meta de defender sua querida Ponte Preta? E o que dizer do transloucado Bozó, que faça chuva ou sol está com a camisa do alviverde? Sem contar Mineirinho, Donana e torcidas como Guerreiros da Tribo e Fúria Independente, locais de encontro de índios urbanos em busca do triunfo. Guarani e Ponte Preta. Uma guerra esportiva separada por apenas uma avenida. Uma rua que se transforma em passarela de tensões e expectativa no dia do dérbi, o acerto de contas entre as duas facções. Negros, crianças, velhos, senhoras, engenheiros, pedreiros, advogados... ninguém fica indiferente aos causos e anedotas gerados a partir do maior clássico do interior do Brasil. Provocações? Várias. O pontepretano levou na esportiva e encarnou a macaca como símbolo de sua equipe; já o bugrino se revolta quando aves e porções de milho são jogadas pelo gramado. Ponte Preta e Guarani. Não importa a história. Pouco interessa o jogo. Eles querem mesmo é fazer a festa do futebol”.
(Escrito pelo meu amigo Elias Aredes Jr, jornalista)
Cartum VI
Maternidade Orozimbo Maia
“No passado Campinas foi bastante mostrada, há uma farta iconografia sobre a cidade. José de Castro Mendes fez belos desenhos de nossa cidade. Nos dias que se seguem, porém, não há grandes registros, falo naturalmente do desenho. A fotografia impera, de maneira que os caricaturistas da imprensa pouco interesse dão à paisagem da cidade. No futuro alguém que pegar os jornais de Campinas terá como referência apenas o ponto de vista dos fotógrafos. A pintura já é mais generosa, encontramos muitos quadros sobre a terra das andorinhas. Mas, se pegarmos os jornais locais, logo perceberemos que os caricaturistas estão falando dos problemas nacionais, raramente focalizam a cidade. Uma exceção recente foi a tira O Nego da Sanfona, publicada no Correio Popular, por um bom período. Nela o caricaturista Mauricio Squarisi abordava episódios da história de Campinas. Felizmente o MeuJornal abre suas páginas para que a cada número Bira nos mostre sua visão, o que já é um grande passo. Bira vem da caricatura, sua linguagem também é das Histórias em Quadrinhos. Seus edifícios, automóveis e pedestres, são naturalmente estilizados. Mas além das informações visuais ele nos mostra também o que é a cidade, com um misto de admiração e critica; afinal a cidade como todo ser vivo, é um poço de contradições. Bira registra pedestres que atravessam a avenida como se estivessem participando de uma maratona, para não serem atropelados. Além do olhar de admiração pela cidade o desenhista também flagra a poluição da cidade, patente no córrego canalizado. Também podemos curtir a arquitetura da cidade, bem pesquisada e caricaturada. Se vocês pensam que é fácil caricaturar um prédio, verão que não é bem assim, é muito mais fácil caricaturar um político ou uma instituição. Bira também costuma colocar em seus desenhos sua maior criação, a filha, que a gente pode tentar descobrir onde está, como naquele livro Onde está Wally?. Nas cartilhas, pôsteres e Histórias em Quadrinhos que Bira produz sempre a coloca. Deixo para vocês leitores a tarefa de descobrirem Onde está Thaís?”.
(Escrito por João Antonio Buhrer – jornalista, antiquário e inspirador desta série de cartuns)
Cartum VII
Rodoviária, feio cartão-postal da cidade, mas une pessoas distantes
Rodoviárias são como portais de transferência de corpos. Como o teletransporte da Enterprise, em Star Trek ou como uma boca enorme por onde chegam e vão milhares de pessoas, todos os dias. E noites. Lembrei de quando, voltando do show de Jerry Lee Lewis no Palace, tomei o ônibus das duas da madruga no terminal Tietê e fiz uma viagem à luz de uma lua cheia e branca como um queijo Minas. Rodei com os outros passageiros uma hora e quinze minutos sem dormir, nem sentir cansaço. O ar frio entrando pela janela e fazendo a cortina balançar sincopadamente me mantinha acordado. Desci na rodoviária e fui pra casa andando. Noite linda para se andar pelas ruas do Botafogo. Parecia ver minha sombra ainda sacudindo aos acordes de Great Balls of Fire. Efeito dos whiskies ou magia do portal rodoviário? Quem saberia dizer? Bira é jornalista e, além de desenhar, adora escrever. Como se desenhasse.
(Escrito por mim)
Cartum VIII
Vila Industrial
“Moro na Vila há 15 anos, mas freqüento-a há uns 25 anos. Este ponto de vista do Bira, em que desenhou o cruzamento da Sales de Oliveira com a São Carlos, tendo ao fundo a Praça do Teatro Castro Mendes, eu observo por dezenas de anos. Cenas como a do catador de papel, figura que passa pela minha rua todo dia, acompanhado de seu fiel cãozinho. O nome dele é Pedro José, desempregado, morador de um cortiço perto da rodoviária. Passo pela rua toda hora, todo dia, e o desenho do Bira veio me alertar para outros tantos detalhes que meus olhos cansados deixaram escapar. A crônica tem esta virtude, sendo ela desenhada ou escrita, tanto faz. Ela nos alerta para a vida que escoa à nossa volta”.
(Escrito por João Antônio, o pesquisador de caricaturas, me surpreendeu com essa história do catador de papel. Foi uma cena que nunca imaginei que pudesse ter acontecido)
Cartum IX
Bucheon, Coréia do Sul
Este eu desenhei da janela do Koryo Hotel onde a delegação da Conferência Mundial de Quadrinhos estava hospedada em Bucheon, com suas largas avenidas lotadas de carros sofisticadíssimos que buzinam estressados. Muito parecida com São Paulo, exceto pelo colorido esfuziante, a limpeza e absoluta falta de pedintes, vendedores de balas, quinquilharias e lavadores de vidro de carro. Numa cidade com prédios tão coloridos e tanta gente com traços orientais eu me senti como Flash Gordon quando desembarcou no Planeta Mongo “uma linda cidade que brilhava como enorme diamante, encravada no alto do planeta”.
(Escrito por mim)
Cartum X
Quando fui desenhar o Viaduto Cury, minha idéia era pegar a perspectiva do olhar do Heringer da janela de seu prédio. Toquei lá, mas Heringer, recém-chegado de Manhu-Mirim, estava batendo pernas pela cidade, visitando os amigos. A chuva caía fina, mas persistente, naquela tarde de dezembro. Saquei de algumas folhas, e do canteiro central da avenida peguei um ângulo rasteiro, exatamente o que os pedestres vêem ao perambular pelos cruzamentos movimentados perto do terminal, na lateral do Palácio dos Azulejos, já retratado por mim, nestas páginas campineiras. E assim, entre um pingo e outro, foi se delineando a avenida que vem do alto do viaduto Cury...
Terminal Viaduto Cury
“Nem sempre ela foi assim: tão hermética e feia. Houve época e os mais antigos campineiros irão se lembrar em que a praça, onde hoje está situado o terminal de ônibus, era linda, encantadora... Os turistas que visitavam esta agradável Campinas paravam sobre os viadutos para fotografá-la. Lagos, jardins, canteiros, flores, tudo ali era muito organizado e belo. Talvez a fúria do crescimento, que sempre traz consigo a necessidade absurda de se abrirem ruas e avenidas, talvez ela tenha sido o seu carrasco. O que restou ainda desta idílica beleza? As palmeiras... e elas testemunhas destes acontecimentos - cresceram, tornaram-se adultas. Posicionada num local estratégico a confluência de várias artérias importantes, sendo que uma delas, a João Jorge, vem a ser a principal via de se entrar na cidade pra quem chega da capital do Estado, tinha mesmo que ser cobiçada. Assim, nada mais natural que olhassem-na com volúpia extremada. Que os ônibus e as gentes necessitem de um terminal decente e bem localizado é fato, mas não precisavam destruir a praça. Agora não há como vê-la direito. Alguns olhares não podem abarcá-la, pois que a construção que ali se fez é um grande mostrengo de ferro e lata. É preciso estar no céu: de avião, helicóptero ou, bem mais fácil, subir ali no edifício ao lado, cujo letreiro luminoso, além de clamar por lucros ao banco a que pertence, avisa também aos paulistas que é tempo... tempo de correr, que São Paulo tem pressa!”.
(Escrito pelo ex-bancário, poeta e foto-chargista Luiz Carlos Heringer)
Cartum XI
O Largo do Rosário
Quando cheguei a esta cidade, fui trabalhar como chargista no Sindicato dos Eletricitários, atual Sinergia, na rua Dr. Quirino (que foi de onde peguei o ângulo de meu primeiro Campinas em Cartum). Era o lugar onde, democraticamente comícios se alternavam, panfletagens eram feitas e pessoas se encontravam. Foi ali, antes de um comício, "tomando uma gelada" no Amarelinho (uma chopperia que ficava na esquina da praça com a Barão de Jaguara) que reencontrei a Cláudia, médica da prefeitura, grande amor da minha vida, responsável pelo Serviço de Saúde do Trabalhador, com quem eu viria a me casar e ter uma gracinha de filha chamada Thaís. Comemos muitas porções de croquetes e casquinhas especiais no Giovanetti do Largo do Rosário. E lá voltamos pra campanha do Toninho com a família a tiracolo, desfraldando bandeiras e gritando palavras de ordem. O ex-bancário e cartunista Heringer, que eu acabara de conhecer, se encantou com minha filha Thaís, e passava o comício inteiro com ela no colo, lembrando-se da sua própria filha, que já tivera o mesmo tamanho e cândido rostinho. Vitória do Toninho e lá estávamos nós de volta ao Largo, com a Thaís empoleirada no meu pescoço, fomos alvo das lentes rápidas e precisas do ótimo fotógrafo João Zinclair.
(Escrito por mim)
Cartum XII
O SESC Bonfim, antigo Hipódromo
“A administração do SESC optou pela construção da sede nova. O local tinha que ser grande. Como num rincão onde era o Hipódromo, próximo ao Bonfim e V. Industrial, um pedaço sem muita expressão da cidade e apareceram uns sujeitos que diziam: -Dr. aqui está muito longe da cidade! E ele respondia: -Você está enxergando Campinas de agora. Temos que enxergar Campinas do futuro! Quando terminamos a construção, já tinha edifícios em volta. Isso cresceu tanto que vinha gente de todos bairros da cidade. E a população de Campinas não precisava mais se deslocar para ter acesso à gama de talentos que nós oferecíamos. Estava tudo aqui. É uma maravilha saber que o SESC esteve (e está) tão presente na vida das pessoas. Este festival de Blues recente mostra um novo padrão, com conforto, som agradável. E o festival de gaita do SESC Pompéia, que faz a pessoa se apaixonar por um instrumento fascinante? Mas o mais impressionante foi nosso Concurso de Pipas com medalhas e prêmios para adultos e crianças. Dava uma alegria ver aquele céu coalhado de pipas, que gostosamente faziam nossa imaginação voar”.
(Escrito por Flávio da Silva Fernandes, primeiro gerente do Sesc Campinas advogado, sociólogo e gerontólogo)
Cartum XIII
Clube Regatas no Cambuí
“Entrou despreocupada em seu biquíni da cor do clube, afinal de contas todos o chamavam carinhosamente de O Vermelhinho e não seria ela a fazer uma desfeita tamanha em colocar algo tipo preto ou branco ou outra cor que não demonstrasse sua gratidão pela existência daquele antigo e abençoado local. Chegou sorridente enquanto a menina levada corria para a água, ávida como toda criança pelas brincadeiras que a grande piscina azul prometia. Não se preocupava com nada ali, embora fosse uma mãe zelosa. Sentia-se em casa. Conhecia todas as pessoas que ali freqüentavam, a história daquele lugar e de seus fundadores a quem admirava e que se misturava com a construção daquela cidade e de seus arredores. Verdade seja dita, não compreendia muito bem algumas coisas. Talvez porque estas fossem incompreensíveis, ou mal-contadas ou mesmo bizarras. Esparramou-se na cadeira confortável. Colocou uns óculos escuros e, fechou os olhos. Não sabe por quanto tempo ficou neste estado de relaxamento. Sentiu de repente que alguma coisa estava errada, como se um alerta fosse ligado sem seu consentimento. Resolveu abrir lentamente os olhos. Foi então que viu aquela criatura tão indesejada indo em sua direção. Não podia acreditar que aquilo estava acontecendo. Uma abelha. Conheci o Bira pelos seus trabalhos expostos na Internet e ele conheceu os meus textos também por esta mídia. A idéia de uma parceria aconteceu há algum tempo atrás só conseguindo ser concretizada através do convite que ele me fez para escrever sobre o Clube Regatas no Cambuí, ao qual aceitei prontamente. Esta foi uma experiência nova e difícil para mim, carioca que sou, não conhecendo Campinas e nem o seu cotidiano. Espero ter feito uma crônica leve e agradável, que possa exprimir um pouco do carinho que este amigo virtual tem por sua cidade. O resto é contação de histórias...”.
(Escrito por Sandra Porto, psicóloga e apaixonada por literatura)
Cartum XIV
Delfino Cintra, o caminho do Centro
Sempre que me desloco em direção ao centro da cidade, a via de acesso direto é, sem duvida, a rua Delfino Cintra. Indo fazer minhas charges no Sinergia, indo dar aulas de caricatura, charge e cartum na Pandora (ao lado da Prefeitura) ou no Regatas (no Cambuí), eu sempre caminho por aí. Quase sempre com uma bolsa cheia de papéis e canetas de um lado e do outro minha gaita de boca. Com ela saio fazendo um som que se misture com o ambiente a minha volta. E vi muitas mudanças ocorrerem neste ambiente, nos quase 20 anos em que moro na cidade. O Giovanetti fechou suas portas e virou um Bingo (apesar da lei federal proibi-los). O asfalto debaixo da Barão de Itapura estourou a cada chuva intensa, que alagou nossa cidade. Pancho Ville abriu e fechou em alguns meses, antes que eu pudesse provar seus tacos apimentados acompanhados de alguma cerveja mexicana. A pracinha ganhou um play-ground para as crianças que nos trouxe o som da algazarra, da folia que a gente escuta, como quando vê um quadro de Cândido Portinari. O Furlan lota todas as tardes de quinta-feira e principalmente depois dos trotes que os recém ingressos na PUC da cidade levam. Claro que é uma farra para os que se divertem e tomam as “estupidamente geladas”. Mas para quem tenta atravessar, de carro ou de ônibus, a área entre a Av. Orozimbo Maia e a Av. Barão de Itapura, é um Deus nos acuda!
(Escrito por mim)