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Chamando a responsabilidade para si
Por Leonardo Santana
28/07/2006

Este é um tema polêmico. O que fazer para publicarmos os nossos trabalhos se não temos um mercado de Quadrinhos Nacionais? Muito já foi – e continua sendo – discutido e existem muitas teorias e projetos caminhando em paralelo nesse sentido. Leis de incentivo a cultura, Projetos de lei que reservam cotas para os Quadrinhos Nacionais, produções independentes, e, até mesmo, pensamentos radicais como o de boicote aos Quadrinhos estrangeiros.

Durante algum tempo, eu mesmo acreditei numa mobilização nacional no seguinte sentido: artista - associação de Quadrinhos ou afim - políticos - lei de protecionismo moderada. Algo bastante semelhante ao proposto pelo Deputado Simplício Mário com a exceção de que os artistas é que seriam responsáveis pelo projeto e teriam uma participação mais ativa na sua concepção e encaminhamento (lógico que através dessas associações). Hoje, eu tenho a impressão de que, mesmo que isso venha a acontecer, ainda assim não servirá para um verdadeiro amadurecimento do artista nacional. Eu creio (e me desculpem os que se ofenderem) que o artista nacional, na sua maioria, tem um ego inflado e espera muito mais dos outros do que de si mesmo.

Não quero aqui negar os empecilhos existentes que dificultam, de fato, aqueles que se excluem da faixa anteriormente mencionada e que passam pelos elevados custos de produção, dificuldade de captação de recursos, precariedade no sistema de divulgação e distribuição e uma desatenção (que já foi maior no passado, mas que, felizmente, vem diminuindo cada vez mais) por parte dos formadores de opinião quanto à produção independente nacional. Mas, todos aqueles que tiverem o mínimo de talento exigido para a coisa e a perseverança de traçar suas metas e atingi-las, não importando os sacrifícios, estes têm sido recompensados (bem ou mal, ainda não importa, visto que sequer temos oficialmente um mercado para o nosso trabalho em nosso próprio país).

Eu poderia citar exemplos, pois com isso, o entendimento se torna automático. E eles são: os desenhistas que estão desenhando para o mercado exterior para pequenas, médias e grandes editoras, como Ed Benes, Julia Bax, Allan Goldman, e tantos outros que nem sequer imaginamos, mas que já estão fazendo seu nome em outros países; são os artistas nacionais que conseguiram furar uma brecha no mercado editorial nacional e emplacar seus trabalhos de uma forma continuada como os Irmãos Bá e Moon (que agora também fazem parte dos artistas que publicam no exterior) e o Lourenço Mutarelli; e alguns autores que estão conseguindo lançar alguns álbuns como André Diniz e Antonio Eder (Chalaça), Spacca (Santô e os pais da aviação), Gonçalo Junior e Flávio Luiz (O Messias) e Laílson (Lusíadas 2500).

Concordo que, se somarmos todos os casos de sucesso, por menores que sejam, e os casos que ainda não tiveram um final feliz, os segundos bateriam os primeiros em uma proporção de 9,8 a 0,2. Isso, é claro, levando em consideração todos os artistas que existem hoje no Brasil. Mas, em todo lugar onde há uma superabundância de oferta e uma procura reduzida ou quase inexistente, somente aqueles que lutam com gana e convicção é que, um dia, talvez sim talvez não, consigam chegar lá.

E é isso que eu julgo importante hoje.

Eu acredito que os artistas nacionais, enquanto continuarem reclamando de que ninguém chega um dia a sua casa, toca a campainha e o convida para publicar na maior editora dos Estados Unidos ganhando um milhão de dólares por ano, cada vez mais eles irão deixar passar a oportunidade de entrar no jogo. Não estou com isso afirmando que toda ajuda não seja bem-vinda, mas a responsabilidade do fracasso ou sucesso deve estar, antes de tudo, em nossas mãos.

Vamos analisar as coisas friamente. O nome desse jogo não é Quadrinhos, arte ou amor. O nome desse jogo é dinheiro. As editoras precisam ganhar muito e gastar pouco, como toda empresa que pretenda se manter. E elas já conseguem isso com as maiores franquias existentes no mercado que são: Marvel, DC Comics, Bonelli, Disney, Mauricio de Sousa, e Mangás. Porém, para a sorte dos artistas nacionais, novas (e algumas nem tão novas assim) editoras têm surgido no mercado. O problema é que essas franquias são exclusivas de outras poucas editoras. O que resta a essas novas editoras é investir em novas franquias e títulos. As opções delas são duas: ou procurar novos títulos desconhecidos do público nacional e investir (dinheiro, sempre ele) em campanhas divulgando esses novos títulos ou investir em trabalhos nacionais de qualidade e apelo comercial (seja ele voltado para um público mais seleto e intelectual ou simplesmente popular) que, em termos financeiros, apresentam os mesmos riscos que um material estrangeiro desconhecido.

Então, nesse cenário, temos uma das pontas descascadas (o das editoras, mesmo que num número reduzido de oportunidades válidas), faltando apenas a outra ponta estar pronta (a dos artistas e de seus trabalhos) para que tenhamos uma corrente elétrica passando energia de um lado para o outro. E é aí que os nossos problemas realmente começam. Nenhuma editora vai pagar para você produzir um trabalho que deverá ser entregue em meses e nenhuma garantia do ponto de vista do cumprimento dos prazos e da qualidade final do produto. Ora, a gente acha injusto produzir sem receber antes. Mas as editoras também não simpatizam em colocar dinheiro na mão de novos artistas nos quais elas não têm certeza (ainda) da capacidade de cumprir os dois requisitos básicos acima.

Então qual seria a alternativa? Ao meu ver, o artista que realmente quer publicar deve primeiro, produzir todo o seu trabalho (ou uma boa parte dele) e apresentar para a(s) editora(s) e torcer para que ela(s) visualize(m) em seu projeto algum aspecto comercial favorável para ela(s). E pronto! Você conseguiu colocar os pés no seu próprio quintal. Falando assim, parece simples, não? Infelizmente, não posso lhes manter essa ilusão. Não há nenhum passo dessa jornada que seja simples ou fácil. É preciso doses cavalares de paciência, humildade, doação, sacrifício, simpatia e sorte, além de mais sorte e um pouquinho mais de sorte.

Mas existem outros aspectos que eu preciso comentar antes de terminar. E, uma vez mais, para revolta de alguns artistas, é justamente sobre as atitudes deles que podem comprometer sua caminhada. A fábula da mãe coruja, de Esopo, ensina que nunca vemos os defeitos de nossos filhos. Assim, também o é, o artista. Principalmente quando acaba uma obra recente. Ele está crente de que aquele é um de seus melhores trabalhos e, muitas vezes, fecha os olhos e os ouvidos para àqueles que encontram defeitos em seus filhos. E, ainda pior, repudiam ferozmente esses críticos. Toda crítica, galgada em opiniões sinceras ou, até mesmo, na inveja e maledicência, devem ser louvadas e, em seguida, analisadas friamente, para, finalmente, serem colocadas à prova com os trabalhos feitos. Cabe então ao artista verificar quais as cabíveis ou não e a decisão de manter ou modificar algum aspecto desse seu trabalho atual ou em futuros. Mas não jamais sem agradecer aos críticos, uma forma carinhosa de alimentá-los para que possam continuar a emitir suas críticas – ferramentas tão necessárias para a nossa evolução como artista e ser humano – em relação aos nossos trabalhos.

Por isso, meus amigos, o princípio básico que eu aplico ao meu próprio trabalho e que eu recomendo a todos vocês é: não percam seu tempo apenas reclamando (ei, reclamar também é importante por que você faz valer o seu direito de opinião e chama a atenção para um problema – existente ou não – e pode gerar idéias e soluções para ele), mas também produzindo (e muito!). Somente através da produção contínua é que seu trabalho se desenvolverá verdadeiramente e que você poderá ter uma real noção de que ele está atingindo, de fato, algum leitor. Tenha humildade para consertar os erros e rever seus conceitos. Mas também tenha convicção da mensagem que você quer passar com o seu trabalho. Publique muito e evolua a sua arte. Os fanzines e revistas independentes estão aí e é preciso olhar para eles com seriedade, sem fazer pouco caso e acreditar que elas são e serão sua verdadeira escola. E, acima de tudo, não desista nunca, doe-se, sacrifique-se (se isto for verdadeiramente o que você quer). As portas estão abertas. Basta apenas querer e aprender a subir os degraus.

(Ilustração: Gerson Witte)

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