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Por Pedro de Luna* 21/07/2006 O dia 19 de julho de 2006 tem tudo para entrar na História dos Quadrinhos Brasileiros. Foi nesta data que, (conforme divulgado aqui), aconteceu o encontro entre a classe e o Deputado Federal Simplício Mário (PT-PI) para discutir o Projeto de Lei 6581/06 que incentiva a produção da HQ Nacional. A reunião, realizada das 10h às 12h45 no Rio de Janeiro, reuniu formadores de opinião num local mais que adequado quando o assunto é lei: a Escola Superior Cândido Mendes. Organizado por mim, o bate-papo contou com a presença do professor e pesquisador Moacy Cirne; o encarregado de marketing da editora Pixel Media Hélio Lopes; os jornalistas Telio Navega (O Globo); Heitor Pitombo (Mosh!) e Marcelo Ribeiro (O Dia, do Piauí); o roteirista Carlos Eugenio "Patati"; os quadrinhistas Andrei Duarte (Araribóia Zine), Luimar (Banda Grossa) e Bernardo Aurélio (Piauí), entre outros. Inicialmente, o deputado explicou a origem do projeto - concebido na Semana de Quadrinhos do Piauí - e esclareceu que o mesmo encontra-se na Comissão de Educação e Cultura, onde o relator Deputado Carlos Biffi incluirá o resultado da discussão.
Patati sugeriu que a taxa de importação de material estrangeiro seja investido em artistas nacionais, como acontece no cinema. Como contraponto, Hélio informou que as editoras brasileiras pagam apenas royalties e um adiantamento sobre as vendas, além de garantir uma tiragem mínima. Ou seja, "a editora se compromete mesmo que não venda nada". Sugeriu-se também a isenção de impostos sobre Quadrinhos Nacionais, inclusive do imposto de renda, no caso de pessoa física - os pequenos mecenas. Simplício Mário lembrou que "a reforma fiscal é urgente e necessária. Na situação em que está hoje, podemos propor isso". A bolha e a lei dos 20% A maior parte do debate girou em torno do 2º artigo, que trata da porcentagem de Quadrinhos que todas as editoras deveriam publicar. Hélio acha que há um risco muito grande e sugere que haja incentivo para lançar as três primeiras HQs de um mesmo autor e/ou lançar fanzines, que seriam um teste de mercado. Falou-se também da Internet como vitrine de novos autores. Foi na rede que personagens como o Capitão Presença, de Arnaldo Branco, e a tira Malvados, de André Dahmer, ganharam popularidade. "O mercado de HQ está uma bolha e ninguém sabe o que vai acontecer", disse Hélio, lembrando que 70% do custo está na impressão e completando: "As editoras viram que HQ dá dinheiro, mas todas estão investindo no mesmo público, brigando pelo mesmo cara". Concluiu-se que, por conta disso, o caminho está cada vez mais nas livrarias, e não nas bancas de jornais. Outra conclusão importante é a necessidade de aumentar a demanda, o mercado consumidor, e não a oferta. Lembrou-se que nas décadas passadas o sonho do quadrinhista era ser contratado por uma editora, mas hoje ele quer apenas publicar por ela, que detém também a distribuição, o marketing e os pontos de venda. "Acredito que a tendência de mercado seja a distribuição de fanzines por grandes editoras, como aconteceu agora com a F e a Conrad (saiba mais sobre este assunto aqui)", opinou Hélio, lembrando que, com a aprovação da lei, as editoras precisarão contratar editores de HQs. E completou: "recebo muito material, porém a qualidade não é boa ou são Quadrinhos que não vão dar retorno financeiro". Outro ponto levantado foi a fiscalização da cota de 20%, que ficaria por conta da Biblioteca Nacional, e pediu-se para incluir um termo no 1º parágrafo deste artigo, mudando para "...publicado ORIGINALMENTE por empresa sediada no Brasil". Muito importante frisar que, na opinião de todos, as distribuidoras não se recusarão a distribuir Quadrinhos Nacionais, mas poderão alegar que não receberam material para distribuir. O piauiense Bernardo lembrou ainda que se deve incluir na lei um artigo que obrigue a lançar uma boa tiragem do Quadrinho Nacional. "Do contrário, para cumprir a cota, a editora lança 1.000 cópias do brasileiro e 10.000 do estrangeiro". Hélio rebateu lembrando que a Pixel lançará Curupira, de Flavio Colin, mas que não poderá imprimir mais que 15 mil exemplares por que não haverá venda. "O desafio está em tornar a HQ uma comunicação de massa", completou. Uma tira nacional para uma estrangeira Os participantes não tiveram muito mais a acrescentar no 4º artigo, que obriga os veículos impressos a publicar uma tira nacional para cada estrangeira. "Eu me preocupei em contar a quantidade de tiras publicadas nos principais jornais do sudeste. A Folha de SP publica 80%, o JB 100%, O Globo 50% e o Estadão publica mais estrangeiros", lembrou Telio Navega. "E quem faz mais que 50%, vai ter que reduzir?", indagou Cirne. "Isso não vai acontecer. Acho que os jornais já sacaram que publicar autores brasileiros é a boa", completou Hélio. "O que falta no Brasil é um Syndicate, uma distribuidora de tiras nacionais", opinou Luimar. Escolas Públicas e Gibitecas A discussão cresceu bastante quando o assunto é incentivo público a leitura, foco do artigo 5º. Entre as sugestões está a criação de mais Gibitecas, parceria com o MEC para fazer material didático em quadrinhos e a difusão de HQs nas escolas através de feira de Quadrinhos. "Sempre tem feira de livros, mas não de HQs. Em eventos do gênero ou Bienais, o custo de stand é muito caro. Pra editora, é mais jogo dar desconto para a loja especializada ir lá e vender", disse Hélio, lembrando que o PNBE - programa nacional que estimula a leitura - adicionou Quadrinhos e seria importante o Deputado verificar para ampliar a verba. Também se falou sobre a importância dos workshops. "Tem que botar a molecada pra desenhar", resumiu Heitor Pitombo. O saudosismo marcou presença quando se lembrou da Bienal de Quadrinhos, que mobilizou o Rio nos anos 1990. Saíram duas boas idéias: a criação de uma Gibiteca móvel, sobre rodas, e o projeto de criação de um espaço no Rio nos moldes da Gibiteca Henfil, de São Paulo. Hélio explicou que o produto fica de 30 a 60 dias na mão da distribuidora e depois volta, sendo lançado em formato coletânea, fazendo uma sugestão em seguida: "a lei poderia prever um fim para o encalhe, um incentivo para que o mesmo seja doado aos colégios".
Telio Navega, Hélio Lopes, Moacy Cirne, Patati, Marcelo (encoberto), Deputado Simplício Mário (gesticulando) e Bernardo Aurélio (em primeiro plano) Surge então uma nova questão: quem ou qual entidade vai avaliar o que é bom para distribuir a verba? Isso vai de encontro ao 6º artigo, que trata de linhas de crédito e financiamento para publicações brasileiras. Bancário com larga experiência no meio, Simplício imagina algo nos moldes do Programa de Agricultura Familiar. Ou seja, "uma empresa externa é quem avaliaria a proposta do autor ou da editora e o banco só daria o dinheiro mesmo. O banco não pode e não tem um funcionário para fazer isso. O que também se pode exigir através da lei é que o livro lançado com verba pública tenha um preço de venda acessível". Sabemos que a parte mais difícil está no período de lançamento da HQ. Com linhas de créditos específicas, o quadrinhista poderia passar para um estágio intermediário, se profissionalizar, viver disso e, quem sabe, começar a lançar novos títulos de outros autores? Nasceriam então pequenas editoras especializadas. "É uma forma de começar o que não tem", filosofou o Deputado. O tempo do encontro estava acabando, mas foi suficiente para novas questões a se pensar - como o incentivo a exportação de HQ Brasileira e o papel do agente literário - e uma boa novidade: "Estou coordenando o primeiro curso de graduação em Histórias em Quadrinhos (saiba mais aqui)", contou Hélio. "Será um curso de dois anos, dentro do Instituto Politécnico da Estácio de Sá. Soube que o governo está oferecendo algo que barateou o curso de Letras. Haveria a possibilidade de ter um incentivo do tipo para a primeira faculdade de HQs e outras que viessem a se instalar no país?". Estas e outras possíveis perguntas serão respondidas provavelmente em novembro numa audiência pública em Brasília. E, quem sabe, com um final pra lá de feliz? (Fotos de Patrícia Amitrano) |
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