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Resenha: Destino Oeste
Por Marko Ajdarić
05/04/2006

Destino Oeste revela uma dupla (ilustrador Ricardo Leite [Ric Milk] e o roteirista Gabriel de Mattos) que se confirma muitíssimo bem naquilo que se propõe: “contar bem uma história”, no caso, duas.

O cuidado começa com aquilo que pode ser definitivo para que o leitor menos avisado descubra o álbum em livrarias: a capa dura em ótima encadernação, com detalhes gráficos que já impõem respeito e uma agradável simpatia à primeira vista. Uma pequena apresentação do autor residente no Brasil com mais títulos em circulação atualmente na Europa - o também mato-grossense Wander Antunes - deve ser sublinhada pela habilidade em levantar o interesse pela leitura deste álbum em preto e branco. A primeira - e mais curta - HQ, chamada Janeiro, 1927, é uma lição de casa mais que bem realizada pelos autores há mais de 10 anos, em que sob o pano de fundo da não-chegada da Coluna Prestes, uma utopia pessoal é criada, destruída e vingada com bons condimentos de uma novela curta. 

Mas é em Asas, HQ realizada em 2004, mas pensada durante anos, que temos um belíssimo prelúdio do que os (nem tão) novos mato-grossenses podem acrescentar à cena nacional dos quadrinhos (em especial, na conquista de novos bons leitores). Com a “desculpa” de nos contar um pouco da briga entre as empresas Latecoére da França e a Sindicato Condor (que viria a se tornar a Cruzeiro do Sul (*), depois encampada pela Varig), de capital alemão, pelos céus do coração da América do Sul, nossa dupla nos faz sacolejar mentalmente com um ritmo suave e seguro, contando, na verdade, algumas histórias cujos desfechos possíveis são deixados a cargo de cada um que tenha a oportunidade de saborear os vários destinos traçados no oeste do Brasil, embora a construção de cenários e personagens seja muito meticulosa e que dificilmente vai deixar de ficar gravada na cabeça do leitor minimamente atento. A obra faz um pouco de metalingüagem, mas ao invés dos super-heróis, o mundo dos quadrinhos está presente em referências a Hergé (o criador de Tintin) e particularmente, na aparição de Zig et Puce (a primeira série clássica dos quadrinhos franco-belgas) e do pingüim Alfred, em plena trama, numa ousadia que acaba sendo muito bem realizada...

Quanto à ilustração, além da variação muito satisfatória de planos e construções originais de páginas que dão um relevo ao álbum sem nunca escorregar por erros muito comuns nesse tipo de tentativa, acreditamos que o grande acerto é o uso do branco (ou tons de cinza), para realçar os desenhos e ações. Além disso, as imagens criadas por Ric Milk têm uma elegância e resolução que ficam muito bem guardadas na mente, muito após o término da leitura. Os mais jovens vão se encantar com vários aspectos da obra, pelo que traz de informação sobre o Pantanal tão pouco conhecido. Os adultos que gostam de obras de qualquer arte que nos levem a dar asas a vários pensamentos encontrarão em Destino Oeste uma prova adicional de que se faz quadrinhos inteligentes longe dos auto-intitulados grandes centros. Quem sabe, para além de oferecer mais tempo para decantar e acariciar o sonho de realizar uma obra, o “pequeno” centro tenha sido benéfico aos nossos autores por ter um governo estadual que teve o bom senso de apostar em uma criação que pode e deve fazer com que a cultura de Mato Grosso acompanhe as mentes das pessoas, e não em “marketices” que são esquecidas a cada 5 dias.

Pelo preço de 27 reais, em termos do que se oferece no Brasil hoje, nossa indicação é muito clara: compre já!

(*) Para os mais velhos, que voaram nas asas da Cruzeiro, fica a explicação do motivo da abreviação da companhia ser SC e não CS.

 

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